tag:blogger.com,1999:blog-11013840886932346292024-02-20T05:19:51.914-08:00Malditos Gregos!Duanne Ribeirohttp://www.blogger.com/profile/15758610155848080935noreply@blogger.comBlogger24125tag:blogger.com,1999:blog-1101384088693234629.post-80641088210132843562014-12-22T17:24:00.000-08:002014-12-22T17:25:32.071-08:00mudança.Este blog, como deve estar evidente pelo abandono, não será mais atualizado.<br />
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Porém temos casa nova onde coisas novas serão postadas. Aqui:<br />
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<a href="https://medium.com/@malditosgregos">https://medium.com/@malditosgregos</a><br />
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Acompanhe também o twitter de citações:<br />
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<a href="http://www.twitter.com/malditosgregos">http://www.twitter.com/malditosgregos</a>Duanne Ribeirohttp://www.blogger.com/profile/06600234935785310864noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-1101384088693234629.post-35575192443514814412012-09-19T09:00:00.000-07:002012-09-19T09:00:08.929-07:00Na Intersecção de Problemas de Seu Tempo<div style="text-align: justify;">
"(...) A doutrina kantiana no espaço, por exemplo, longe de ser uma 'opinião' filosófica entre outras, está na intersecção de problemas levantados pela ciência de seu tempo. Se separássemos Kant desse pano de fundo científico, não somente estaríamos traindo a verdade histórica, mas também nos expondo a ver na filosofia transcendental um monumento genial, mas gratuito e paradoxal. (...)</div>
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Para Leibniz, a extensão, quer dizer, o espaço contínuo dos geômetras, é um 'fenômeno' (no sentido pejorativo de "aparência"). 'Toda a continuidade é uma coisa <i>ideal</i>' — e o espaço quantitativo e mensurável não passa de uma imaginação <i>bem fundada</i> (uma vez que a distância espacial traduz uma relação qualitativa de ordem entre as substâncias), mas, enfim e sobretudo, <i>uma imaginação</i>. Por que Leibniz sustenta essa tese? Tal é a questão que Kant vai colocar-se. E é por colocar-se essa questão, por tentar desentranhar o pressuposto que torna sofística a tese de Leibniz, que Kant <i>critica</i> Leibniz, no verdadeiro sentido da palavra <i>criticar</i>. É essa reflexão crítica que muitos manuais estão traindo quando nos dizem: 'Leibniz pensava que... Depois Kant pensou que...' — como se Kant tivesse contentado com opor à opinião leibniziana uma opinião kantiana: a doutrina kantiana do espaço nasce quando Kant se pergunta por que Leibniz não poderia ter razão e não porque Kant teria decidido que Leibniz estado errado.</div>
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<span style="text-align: right;">de "</span><a href="http://books.google.com.br/books?id=R_-GZXzaa74C&lpg=PP1&hl=pt-BR&pg=PA25#v=onepage&q&f=false" style="text-align: right;">O Papel do Espaço na Elaboração do Pensamento Kantiano</a><span style="text-align: right;">", texto de </span><i style="text-align: right;">Sobre Kant</i><span style="text-align: right;">, de Gérard Lebrun.</span>Duanne Ribeirohttp://www.blogger.com/profile/06600234935785310864noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-1101384088693234629.post-26968895183838117282012-09-15T15:50:00.002-07:002012-09-15T15:54:03.726-07:00Filosofia: Polêmica das Ciências<div style="text-align: justify;">
"(...) Não-especialista por profissão, o filósofo, se for honesto, padece de ter muito que aprender com os especialistas e poucas coisas a dizer-lhes que eles já não saibam. Será preciso, pois, ter saudade do tempo em que os filósofos eram ao mesmo tempo cientistas? Seria ingenuidade. Se hoje os cientistas não têm mais necessidade nenhuma dos filósofos nem, sobretudo, de se fazer filósofos, é na medida em que seus métodos estão em ordem, seus conceitos são universalmente admitidos e as querelas científicas rareiam. Que apareçam contradições (crise da teoria dos conjuntos, em matemática, no começo do século), que nasçam controvérsias (problema da hereditariedade do adquirido, em biologia), e bem depressa o cientista volta a tornar-se filósofo. Outro indício do mesmo fato nós encontramos no favor de que gozam as ciências humanas junto aos filósofos de hoje em dia: não será porque estas estão no mesmo estado de balbuciamento e de insegurança em que se encontravam o cálculo infinitesimal no século XVII e a mecânica no século XVIII? A filosofia é a polêmica das ciências quando estas estão pouco elaboradas o bastante para dar lugar a polêmicas: inseparável da juventude das ciências, afasta-se delas quando atingem a idade adulta, e pode-se dizer, penso, que o interesse filosófico oferecido por uma ciência mede com bastante exatidão seu inacabamento como ciência."</div>
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de "<a href="http://books.google.com.br/books?id=R_-GZXzaa74C&lpg=PP1&hl=pt-BR&pg=PA25#v=onepage&q&f=false">O Papel do Espaço na Elaboração do Pensamento Kantiano</a>", texto de <i>Sobre Kant</i>, de Gérard Lebrun.</div>
Duanne Ribeirohttp://www.blogger.com/profile/06600234935785310864noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-1101384088693234629.post-27192882822627461192012-09-05T09:30:00.000-07:002012-09-06T15:55:50.300-07:00Fenomenologia Poética<div style="text-align: justify;">
Na introdução de <i>A Poética do Espaço</i>, o filósofo Gaston Bachelard propõe um método de análise literária que não se baseia no autor ou na obra; não avalia filiações biográficas nem implicações sociológicas ou coerências estruturais. Bachelard se volta ao elemento literário mais essencial, a imagem poética em sua unicidade, em outros termos: "Para esclarecer filosoficamente o problema da imagem poética, é preciso chegar a uma fenomenologia da imaginação. Esta seria um estudo do fenômeno da imagem poética quando a imagem emerge na consciência como um produto direto do coração, da alma, do ser do homem tomado em sua atualidade". <span style="font-size: x-small;">(Bachelard, </span><span style="font-size: x-small;"><i>A Poética do Espaço</i><span style="background-color: white;">, </span><span style="background-color: white;">Martins Editora, </span><span style="background-color: white;">2000)</span></span></div>
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De que trata, como age uma pesquisa que se diz fenomenológica? Um modo de compreender o uso da palavra é procurar sua definição no “fundador da fenomenologia”, o filósofo alemão Edmund Husserl. Para Husserl, a fenomenologia é “filosofia como ciência rigorosa”, em essência diferente da pesquisa científica, porque trata não dos objetos sensíveis, mas dos fundamentos do saber. Não substitui, supera ou se envolve com as ciências tradicionais — mas analisa um objeto que é anterior a elas, que é como que suas condições de possibilidade. Nas palavras dele: "<span style="background-color: white;">O método da crítica do conhecimento é o fenomenológico; a fenomenologia é a doutrina universal das essências, em que se integra a ciência da essência do conhecimento". <span style="font-size: x-small;">(<i>A Ideia da Fenomenologia</i>, Lisboa: Edições 70, 2008)</span>.</span></div>
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A fenomenologia é portanto um pensamento que retorna às origens do pensamento. Embora as pesquisas dos dois filósofos sejam diferentes tanto em escopo quanto em alcance, é possível construir alguns paralelos esclarecedores sobre nosso tema.</div>
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Enquanto Husserl fala de “essência do conhecimento”, em sentido específico que não cabe avaliar aqui, Bachelard cita o “produto mais fugaz da consciência: a imagem poética”. Não só na literatura, mas na pintura, ele diz que sua fenomenologia “pode revelar o primeiro compromisso de uma obra”. Se a fenomenologia husserliana trata das condições que fazem possível o saber, a de Bachelard explora as que possibilitam a arte. Um está um passo antes da racionalidade, outro no mais primário da subjetividade. Bachelard dirá de seu objeto: “a imagem poética é um súbito realce do psiquismo”; “atualidade essencial, a essencial novidade psíquica”; ou ainda “o ato poético não tem passado”.</div>
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<b>Alma e Espírito</b></div>
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Bachelard não só a chama seu projeto de “fenomenologia <i>da imaginação</i>”, mas também <i>da alma</i>. Esse segundo termo é elucidativo do campo de trabalho do filósofo, sendo preciso avaliar em que sentido ele é usado neste texto. No trecho "(...) na filosofia alemã (...) a distinção entre o espírito e a alma (<i>der Geist</i> e <i>die Seele</i>) é tão nítida" <span style="font-size: x-small;">(Bachelard<span style="background-color: white;">, </span><span style="background-color: white;">2000</span>)</span> temos uma primeira indicação do que possa significar. A filosofia alemã contemporânea a Bachelard de fato distinguia entre espírito e alma, como <a href="http://books.google.com.br/books?id=Tm38cSpH1vAC&lpg=PP1&dq=inauthor%3A%22Jos%C3%A9%20Ferrater%20Mora%22&hl=pt-BR&pg=PA86#v=onepage&q&f=false">descrito no <i>Dicionário de Filosofia - Tomo I</i>, de José Ferrater-Mora</a>: </div>
<blockquote class="tr_bq" style="text-align: justify;">
"O vocábulo ‘alma’ voltou a ser usado por vários autores contemporâneos (Jaspers, Scheler, Ortega y Gasset, F. Noltenius etc.) num sentido um pouco diferente de qualquer um dos tradicionais. (...) Enquanto a alma é concebida como a "sede" dos atos emotivos, dos afetos, sentimentos etc., o espírito é definido como a "sede" de certos atos "racionais" (atos por meio dos quais se formulam juízos objetivos ou pretensamente objetivos). De acordo com isso, a alma é subjetividade, enquanto o espírito é objetividade." <span style="font-size: x-small;">(São Paulo: Edições Loyola: 2004)</span>.</blockquote>
<div style="text-align: justify;">
<span style="background-color: white;">Podemos crer que esta é uma posição próxima a de Bachelard, dado o seguinte trecho:</span></div>
<blockquote class="tr_bq" style="text-align: justify;">
"O espírito pode relaxar-se; mas no devaneio poético a alma está de vigília, sem tensão, repousada e ativa. Para fazer um poema completo, bem estruturado, será preciso que o espírito o prefigure em projetos. Mas para uma simples imagem poética não há projeto, não lhe é necessário mais que um movimento da alma. Numa imagem poética a alma afirma a sua presença." <span style="font-size: x-small;">(Bachelard<span style="background-color: white;">, </span><span style="background-color: white;">2000</span>) </span></blockquote>
<div style="text-align: justify;">
<span style="background-color: white;">A descrição de </span><i style="background-color: white;">imagem poética</i><span style="background-color: white;"> ao longo da introdução de </span><i style="background-color: white;">A Poética do Espaço</i><span style="background-color: white;"> traz com frequência esse ingrediente dinâmico, essa </span><i style="background-color: white;">iminência</i><span style="background-color: white;">. Bachelard diz: “a </span><i style="background-color: white;">explosão</i><span style="background-color: white;"> de uma imagem”; “a imagem </span><i style="background-color: white;">repentina</i><span style="background-color: white;">, a </span><i style="background-color: white;">chama</i><span style="background-color: white;"> do ser na imaginação”; “a alma </span><i style="background-color: white;">inaugura</i><span style="background-color: white;">. Ela é aqui </span><i style="background-color: white;">potência inicial</i><span style="background-color: white;">” [grifos meus]. Mais adiante, na parte IV do texto, afirmará que as imagens poéticas fazem parte de uma “primitividade da imaginação”. O trecho é significativo, pois reforça a interpretação que expomos acima sobre </span><i style="background-color: white;">alma</i><span style="background-color: white;"> e</span><i style="background-color: white;"> espírito</i><span style="background-color: white;">: "</span><span style="background-color: white;">(...) um pequeno impulso de admiração é necessário para se obter o benefício fenomenológico de uma imagem poética. A menor reflexão crítica detém esse impulso, colocando o espírito em posição secundária, o que destrói a primitividade da imaginação" <span style="font-size: x-small;">(idem)</span>.</span></div>
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<div style="text-align: justify;">
O mesmo trecho permite entrever um outro elemento fundamental: o encontro de uma subjetividade com a imagem poética, fruto primário de <i>outra</i> subjetividade.</div>
Duanne Ribeirohttp://www.blogger.com/profile/06600234935785310864noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-1101384088693234629.post-16716921827163358972012-08-22T09:30:00.000-07:002012-08-22T09:30:01.001-07:00Materialismo Histórico, Psicanálise, Biologia: Machistas?<div style="text-align: justify;">
A célebre frase <span style="background-color: white;">“não se nasce mulher, torna-se”, de </span><span style="background-color: white;"><i>O Segundo Sexo</i>, de Simone de Beauvoir ecoa a de Jean-Paul Sartre, de </span><i>O Existencialismo é um Humanismo</i><span style="background-color: white;">: "A existência precede a essência". </span><span style="background-color: white;">Se com isso o filósofo francês pretendia dizer</span><span style="background-color: white;"> que não há determinações prévias ao indivíduo, um "manual prévio" que defina como ele deverá agir, pensar, sentir ou ser, em Beauvoir </span><span style="background-color: white;">isso ressalta que não há uma "essência feminina", algo que defina <i>a priori</i> o destino de uma mulher. Sartre diz:</span></div>
<blockquote class="tr_bq" style="text-align: justify;">
"(...) há pelo menos um ser no qual a existência precede a essência, um ser que existe antes de poder ser definido por qualquer conceito: esse ser é o homem, ou, como diz Heidegger, a realidade humana. O que significa, aqui, dizer que a existência precede a essência? Significa que, em primeira instância, o homem existe, encontra a si mesmo, surge no mundo e só posteriormente se define. O homem, tal como o existencialista o concebe, só não é passível de uma definição porque, de início, não é nada: só posteriormente será alguma coisa e será aquilo que fizer de si mesmo". <span style="font-size: x-small;">(Sartre, <i>O Existencialismo é um Humanismo</i>, 1970)</span></blockquote>
<div style="text-align: justify;">
<span style="background-color: white;">Da mesma forma, para compreender a posição da mulher teremos de ter em mente esse momento anterior a estar no mundo, antes de qualquer definição. Talvez possamos dizer: <i>a mulher será alguma coisa, será aquilo que fizer de si mesma</i>. </span><span style="background-color: white;">Nos primeiros capítulos de <i>O Segundo Sexo</i>, Beauvoir trata de refutar os opositores dessa não-determinação natural da mulher. São alvos: a biologia, </span><span style="background-color: white;">a psicanálise, </span><span style="background-color: white;">o materialismo histórico.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="background-color: white;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="background-color: white;">Com base na biologia, por exemplo, já se sustentou que a posição de submissão das mulheres na sociedade se dava como análogo das operações celulares: a crença, desfeita por Beauvoir, é de que só o espermatozóide é ativo na reprodução, sendo o óvulo <i>passivo — </i>o que explicaria a organização social. Outro exemplo no âmbito das ciências biológicas é o de um recorte das fêmeas encontradas no mundo animal, selecionadas de acordo com qualidades que se espera ver na fêmea humana. Beauvoir contraria essa opinião indicando uma variedade muito maior na natureza, que torna contraditória essa concepção, como afirmando as características únicas da fêmea humana). </span><span style="background-color: white;">Já a psicanálise tem o mérito de destacar a importância do corpo, mas é insuficiente, por considerar a </span><span style="background-color: white;">sexualidade feminina <i>pela</i> ótica masculina, e não <i>em si</i>). </span><span style="background-color: white;">Segundo a filósofa francesa:</span><br />
<blockquote class="tr_bq">
<span style="background-color: white;">"É, portanto, à luz de um contexto ontológico, econômico, social e psicológico que teremos de esclarecer os dados da biologia. A sujeição da mulher à espécie, os limites de suas capacidades individuais são fatos de extrema importância; o corpo da mulher é um dos elementos essenciais da situação que ela ocupa nesse mundo. Mas não é ele tampouco que basta para a definir. Ele só tem realidade vivida enquanto assumido pela consciência através das ações e no seio de uma comunidade (...)". </span><span style="background-color: white; font-size: x-small;">(Beauvoir, <i>O Segundo Sexo</i>, 1949)</span></blockquote>
</div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="background-color: white;">O materialismo histórico, por fim, é lido através de </span><span style="background-color: white;">Engels, em <i>A História da Família</i>. O pensador coloca como um momento necessário do progresso humano a colocação de capacidade produtiva da mulher como secundária, sem especificar porque esse processo era absolutamente necessário e quais os motivos pelos quais aconteceu.</span></div>
<blockquote class="tr_bq" style="text-align: justify;">
<span style="background-color: white;">"Para descobrir a mulher não recusaremos certas contribuições da biologia, da psicanálise, do materialismo histórico, mas consideraremos que o corpo, a vida sexual, as técnicas só existem concretamente para o homem na medida em que os apreende dentro da perspectiva global da sua existência. O valor da força muscular, do falo, da ferramenta só se poderia definir num mundo de valores: é comando pelo projeto fundamental do existente transcendendo-se para o ser". <span style="font-size: x-small;">(idem)</span></span></blockquote>
<div style="text-align: justify;">
<span style="background-color: white;">Assim, </span><span style="background-color: white;">o "tornar-se mulher" é encarado como um processo. O <i>existente</i> nasce corpo, nasce animal e nasce sujeito em certa economia, sociedade e período; a significação que ele receberá e a que dará a si mesmo são imposições e escolhas não-naturalizáveis.</span></div>
Duanne Ribeirohttp://www.blogger.com/profile/06600234935785310864noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-1101384088693234629.post-81667742827506630082012-08-15T09:30:00.001-07:002012-08-15T09:30:02.162-07:00A Origem da Superstição<div style="text-align: justify;">
<span style="background-color: white;">Para Espinoza, na origem da superstição está um entendimento equívoco sobre as coisas do mundo. Os homens ignoram as causas e têm sua compreensão entorpecida por preconceitos – que surgem de tendências humanas comuns e de impressões recebidas da imaginação. De acordo com o filósofo, todos esses prejuízos</span></div>
<blockquote class="tr_bq" style="text-align: justify;">
"(...) dependem de um só, a saber: os homens supõem comumente que todas as coisas da Natureza agem, como eles mesmos, em consideração de um fim, e até chegam a ter por certo que o próprio Deus dirige todas as coisas para determinado fim, pois dizem que Deus fez todas as coisas em consideração do homem, e que criou o homem para que este lhe prestasse culto."<span style="font-size: x-small;">(Espinoza, <i>Ética</i>, em <i>Os Pensadores</i>, São Paulo: Nova Cultural, 1991, p.p. 114-5)</span></blockquote>
<div style="text-align: justify;">
<span style="background-color: white;">Em outros termos, trata-se do <i>preconceito finalista</i>. O apêndice da primeira parte da <i>Ética</i> identifica duas de suas partes fundamentais: a <i>primeira</i>, que os homens creiam-se dotados de livre-arbítrio, que desconheçam as causas de suas vontades; a <i>segunda</i>, que ajam sempre em vista de um fim e que acreditem que esse modo de agir é análogo nos demais homens, na natureza e em deus. Frente a fatos que causem perplexidade, catástrofes, grandes bonanças – o que questiona é não propriamente o<i> por quê</i>, mas qual o fim pelo qual se deram . A <i>superstição</i> parece ser a sistematização desses prejuízos; é sua forma complexa e mais resistente:</span></div>
<blockquote class="tr_bq" style="text-align: justify;">
"(...) este prejuízo tornou-se em superstição e lançou profundas raízes nas mentes, dando origem a que cada um aplicasse o máximo esforço no sentido de compreender as causas finais de todas as coisas e de as explicar; mas, conquanto se esforçassem por mostrar que na Natureza nada se produz em vão (isto é, que não seja para proveito humano), parece que não deram a ver mais do que isto: a Natureza e os deuses deliram tal qual os homens." <span style="font-size: x-small;">(idem, p. 116)</span></blockquote>
<div style="text-align: justify;">
<span style="background-color: white;">O medo assume aí uma função fundamental: ele é “a causa que origina, conserva e alimenta a superstição” (como diz Espinoza, no <i>Tratado Teológico-Político</i>, Martins Fontes, 2003). De acordo com Rogério Silva Magalhães, no artigo </span><span style="background-color: white;">“<a href="http://www.fflch.usp.br/df/espinosanos/ARTIGOS/numero%2019/rogerio19.pdf">Imaginação e superstição no Tratado Teológico-Político (Cap. I ao XV)</a>”:</span></div>
<blockquote class="tr_bq" style="text-align: justify;">
"A insegurança perante as adversidades da vida transforma o homem em um ser vulnerável às superstições. O medo de males futuros ou de não obter os bens materiais que almeja no presente nutre a superstição, levando o homem a se tornar um fervoroso devoto, dando assim origem ao abandono da razão." <span style="font-size: x-small;">(p. 102)</span></blockquote>
<div style="text-align: justify;">
<span style="background-color: white;">Tanto o temor do perigo quanto a esperança de bonança parecem ser duas faces da mesma moeda: são a expressão do desconhecimento humano sobre as condições futuras. Portanto, o medo – em sentido amplo, com suas duas formas – e a ignorância se fundem e se tornam mais complexas nesse sistema que é a superstição. <i>Sistema</i>, porque se põe, como a ciência, feito uma forma de <i>explicar</i> as coisas do mundo; e, principalmente, porque <i>resistente</i>, com defesas próprias contra eventos que poderiam desmistifica-la (compare com o <a href="http://malditosgregos.blogspot.com.br/2011/10/blog-post.html">conceito de pseudociências de Karl Popper</a>).</span></div>
<blockquote class="tr_bq" style="text-align: justify;">
"Embora a experiência de cada dia protestasse e patenteasse com exemplos sem conta que os eventos benéficos e maléficos atingiam indistintamente indivíduos devotos e ímpios, nem por isso abandonaram o inveterado prejuízo. Foi-lhes mais fácil colocar isso no número das coisas cuja utilidade desconheciam, e assim se conservarem no estado presente e nativo da ignorância, do que destruir toda essa construtura e pensar numa nova. Daqui assentarem por certo os juízos dos deuses ultrapassavam muitíssimo a capacidade humana." <span style="font-size: x-small;">(Espinoza, 1991, p.116)</span></blockquote>
<div style="text-align: justify;">
<span style="background-color: white;">Frente aos desacordos da explicação supersticiosa e do mundo, ergue-se a ignorância como uma espécie de princípio epistemológico absoluto: há finalidades que não nos é possível ou cabível conhecer. A superstição está, pois, resguardada no que Espinoza chama de “asilo da ignorância”. Em suma, ela nasce de predisposições naturais do humano, do seu desconhecer e do seu medo, do seu mover-se em prol de fins e da sua esperança; funciona para confortar o homem nesse núcleo em que ele é muito suscetível ao engano. É também nesse ponto que um poder alheio sobre o indivíduo pode ser fundado: um poder </span><i style="background-color: white;">teológico-político</i><span style="background-color: white;">...</span></div>Duanne Ribeirohttp://www.blogger.com/profile/06600234935785310864noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-1101384088693234629.post-74360326449565532612012-08-08T09:30:00.001-07:002012-08-08T09:30:01.383-07:00Perigo de Não Ser Compreendido<div style="text-align: justify;">
Trecho do "Prefácio à Segunda Edição" da <i>Crítica a Razão Pura</i>, do filósofo prussiano Immanuel Kant. Creio que é particularmente interessante pelo ênfase que o autor dá aos comentadores da obra, e, assim, à construção coletiva do conhecimento. Esses "homens beneméritos" aperfeiçoam o conteúdo no sentido da elegância, corrigem alguns erros pontuais que escapam à solidez do todo e apoiam, socialmente, a "ideia do todo" do sistema quando ela é ainda novo e desprezado pelo estabelecido (neste último ponto, Kant lembra a descrição de Thomas Kuhn em <i>A Estrutura das Revoluções Científicas</i>). Segue:</div>
<div style="text-align: justify;">
===</div>
<div style="text-align: justify;">
<br />
"(...) percebi, com grata satisfação, que o espírito de meticulosidade não se extinguiu na Alemanha, mas foi somente sufocado por algum tempo pelo modismo de uma liberdade de pensamento às raias do genial, e que as espinhosas veredas da crítica que conduzem a uma ciência escolástica da razão pura, mas como tal a única duradoura e por isso absolutamente necessária, não impediram as cabeças corajosas e lúcidas de se apoderarem dela. A estes homens beneméritos, que à meticulosidade do discernimento aliam de modo tão feliz o talento de uma exposição luminosa (a qual não me sinto bem consciente de possuir), deixo o encargo de concluir, no tocante ao último ponto, minha elaboração aqui e ali porventura ainda defeituosa; pois o perigo neste caso reside não em ser refutado, mas em não ser compreendido. De minha parte, não posso doravante meter-me em controvérsias, embora atente cuidadosamente a todas as sugestões, sejam de amigos ou de inimigos, para utilizá-las, de acordo com esta propedêutica, na futura execução do sistema. Já que durante estes trabalhos atingi uma idade relativamente avançada (este mês completarei sessenta e quatro anos), se quero executar meu plano de fornecer tanto a Metafísica da Natureza quanto a Metafísica dos Costumes como confirmação da correção da crítica da razão tanto especulativa quanto prática, tenho que usar com parcimônia o meu tempo como esperar dos homens beneméritos que tomaram a si essa tarefa tanto o esclarecimento das obscuridades inicialmente inevitáveis nesta obra quanto a defesa do todo. Em pontos isolados cada exposição filosófica é vulnerável (pois não pode apresentar-se tão blindada como a exposição matemática). Entretanto, a estrutura do sistema, considerada como unidade, não corre com isso o mínimo perigo; com efeito, só poucos possuem a agilidade do espírito pra abranger com a vista o sistema quando este é novo, e menor número ainda tem prazer nisso, pois toda novidade lhes é importuna. Em cada escrito desenvolvido sob forma de livre discurso são pinçáveis aparentes contradições quando se arrancam partes isoladas do seu conjunto e se as compara entre si, contradições essas que aos olhos daquele que se abandona ao julgamento de outros projetam por sua vez uma luz prejudicial sobre esses escritos, mas que se resolvem muito facilmente para aquele que se apoderou da idéia no seu todo. Todavia, quando uma teoria é sólida, tanto a ação quanto a reação que inicialmente a ameaçavam com grande perigo, com o tempo servem somente para aplainar os seus desníveis, e quando homens dotados de imparcialidade, discernimento e verdadeira popularidade ocuparam-se com ela, em pouco tempo servem para proporcionar-lhe também a elegância requerida."</div>
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<br /></div>
<div style="text-align: right;">
<span style="font-size: x-small;">(<i>Os Pensadores</i>, São Paulo: Nova Cultural, 1999, 50-51)</span></div>Duanne Ribeirohttp://www.blogger.com/profile/06600234935785310864noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-1101384088693234629.post-92076326691509673902012-08-01T09:30:00.000-07:002012-08-01T09:30:03.173-07:00Descontinuidades do Conhecimento<div style="text-align: justify;">
<span style="background-color: white;">Para Michel Foucault, Uma <i>epistémê</i> é uma configuração epistemológica, uma disposição do espaço do saber que define quais objetos são dados ao pensamento e em que condições. São, segundo ele, as condições de possibilidade para que algo seja pensado. Um pensamento que se proponha estudar esse tipo de formação não se resumirá a expor a sequência temporal de ideias ou debates, mas de perceber qual o terreno que possibilitou essas ideias e debates.O livro <i>As Palavras e as Coisas</i> analisa essas construções da racionalidade, em um projeto descrito pelo autor como <i>arqueológico</i>. Uma definição geral desse projeto é encontrada no seguinte trecho:</span></div>
<blockquote class="tr_bq" style="text-align: justify;">
Tal análise, como se vê, não compete à história das ideias ou das ciências: é antes um estudo que se esforça por encontrar a partir de que foram possíveis conhecimentos e teorias; segundo qual espaço de ordem se constitui o saber; na base de qual <i>a priori</i> histórico e no elemento de qual positividade puderam aparecer ideias, constituir-se ciências, refletir-se experiências em filosofias, formar-se racionalidades, para talvez se desarticularem e logo desvanecerem. <span style="font-size: x-small;">(Foucault, <i>As Palavras e as Coisas</i>, São Paulo: Martins Fontes, 2007, p. XVIII)</span></blockquote>
<div style="text-align: justify;">
<span style="background-color: white;">A distinção entre uma “história das ideias ou das ciências” e uma arqueologia é de imensa relevância e emerge em muitos outros pontos do livro. O que Foucault quer estabelecer são diferentes níveis de pesquisa: as opiniões, os debates, os desenvolvimentos teóricos — tais elementos se dão na superfície. Abaixo disso, sendo fundamento e lugar onde isso ocorre, está o campo epistemológico que é o objeto da arqueologia. A constatação <i>superficial</i> será constantemente evocada por Foucault, para em seguida opor a ela a análise do fundamento. </span></div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
Por exemplo, a respeito de mudanças na <i>epistémê</i> do século XVII ao XVIII, ele afirma: “no nível de uma história das opiniões, tudo isso apareceria sem dúvida como uma imbricação de influências, em que seria necessário sem dúvida fazer aparecer a parte individual que cabe a Hobbes, Berkeley, Leibniz, Condillac”. Logo após, ressalta os conceitos que regem tal configuração, como eles abrem o espaço em que pode existir esses debates, “não como temas sucessivos engendrando-se ou repelindo-se uns aos outros, mas como uma rede única de necessidades. E foi ela que tornou possíveis essas individualidades a que chamamos Hobbes ou Berkeley ou Hume ou Condillac” <span style="font-size: x-small;">(idem, p.87)</span>.</div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
Argumentação semelhante surge com mais detalhe quanto à disputa de ideias no âmbito da análise de riquezas, também no campo epistemológico do XVIII:</div>
<blockquote class="tr_bq" style="text-align: justify;">
"(...) se o fato de pertencer a um grupo social pode sempre explicar que este ou aquele tenha escolhido um sistema de pensamento de preferência a outro, a condição para que esse sistema tenha sido pensado não reside jamais na existência desse grupo. É preciso distinguir com cuidado duas formas e dois níveis de estudos. Um seria a pesquisa de opiniões para saber quem, no século XVIII, foi fisiocrata e quem foi antifisiocrata; quais os interesses em jogo; quais os pontos e os argumentos da polêmica; como se desenrolou a luta pelo poder. O outro, sem levar em conta personagens nem sua história, consiste em definir as condições a partir das quais foi possível pensar, em formas coerentes e simultâneas, o saber “fisiocrático e o saber “utilitarista”. A primeira análise seria pertinente a uma doxologia. A arqueologia só pode reconhecer e praticar a segunda." (<span style="font-size: x-small;">ibidem, p. 278</span>)</blockquote>
<div style="text-align: justify;">
<span style="background-color: white;">Há aí vários pontos relevantes. A arqueologia não se propõe a estudar por que os indivíduos de um ou outro grupo se mantiveram ligados a determinada forma de pensamento. Não está avaliando que interesses criaram o debate entre lados opostos. Pesquisa, sim, o que tornou possíveis as formas de pensamento, <i>mesmo antagônicas</i>, no âmbito de uma cultura. </span></div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
Ainda um terceiro exemplo tornará essa separação ainda mais clara. No início do capítulo sobre a História Natural, Foucault descreve os modos pelos quais “as histórias das idéias ou das ciências” entendem as mudanças nas ciências da vida na passagem do XVII ao XVIII. Recorrem elas ao aperfeiçoamento da observação (pelos avanços técnicos ou teóricos), ao prestígio das ciências físicas e à transposição do seu modelo, ao interesse pela agricultura e ao fracasso do mecanicismo cartesiano. Porém, antes das mudanças na <i>epistémê</i>, não havia surgido o objeto mesmo da História Natural ou a História Natural como tal; a natureza era <i>pensada</i> de outro modo, definido pelo campo epistemológico. Ela se dava como objeto em <i>um sentido</i> no XVI e em <i>outro sentido</i> no XVIII. É sobre esse objeto feito necessário que a técnica poderá se aplicar. “Infelizmente, as coisas não se passam com essa simplicidade”, afirma o filósofo <span style="font-size: x-small;">(ibidem, p.175)</span>.</div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
Retomemos agora o primeiro trecho citado. Nele, é visível uma característica essencial das <i>epistémês</i>: cada disposição a partir da qual os saberes são possíveis é, pois, suscetível de <i>desarticulação</i> (os seus elementos já não tem a mesma relação mútua) e <i>desvanecimento</i> (seus objetos próprios ou segmentos críticos deixam de existir). Uma racionalidade como que se condensa em um ponto do tempo e se desfaz. A imagem usada por Foucault para indicar essa decomposição de determinada formação é a da erosão:</div>
<div style="text-align: justify;">
<blockquote class="tr_bq">
"O descontínuo — o fato de que em alguns anos, por vezes, uma cultura deixa de pensar como fizera até então e se põe a pensar outra coisa e de outro modo — dá acesso, sem dúvida, a uma erosão que vem de fora, a esse espaço que para o pensamento, está do outro lado, mas onde, contudo, ele não cessou de pensar desde a origem." <span style="font-size: x-small;">(ibidem, p. 69)</span></blockquote>
</div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="background-color: white;">Um além do pensamento corrói as estruturas próprias de cada formação. O modo pelo qual isso ocorre é apenas sinalizado no decorrer de <i>As Palavras e as Coisas</i>. </span></div>
<blockquote class="tr_bq" style="text-align: justify;">
"(...) o problema que se formula é o das relações do pensamento com a cultura: como sucede que um pensamento tenha um lugar no espaço do mundo, que aí encontre como que uma origem, e que não cesse, aqui e ali, de começar sempre e de novo? Mas talvez não seja ainda o momento de formular o problema; é preciso provavelmente esperar que a arqueologia do pensamento esteja mais assegurada, tenha mais bem assumido a medida daquilo que ela pode descrever direta e positivamente (...) Bastará, pois, por ora, acolher essas descontinuidades na ordem empírica, ao mesmo tempo evidente e obscura, em que se dão." <span style="font-size: x-small;">(ibidem, p. 69)</span></blockquote>
<div style="text-align: justify;">
<span style="background-color: white;">A arqueologia descreve a sucessão dessas descontinuidades. Jürgen Habermas, no texto </span>“Aporias de uma teoria do poder”, do livro <i>O
Discurso Filosófico da Modernidade – Doze Lições</i> <span style="font-size: x-small;">(São Paulo: Martins Fontes, 2002, pp.375-76)</span> aponta uma deficiência desse momento foucaultiano. Se a análise arqueológica pode encontrar os princípios que regem as condições de possibilidade de tal discurso, entretanto, não pode explicar o que rege a disposição desses princípios: “Com efeito, não existem regras capazes de regular sua própria aplicação”. Nas obras posteriores, esse problema terá um novo direcionamento, segundo Habermas: “Foucault contorna essa dificuldade abandonando a autonomia das formas do saber em favor de sua fusão em tecnologias do poder e <i>subordinando</i><span style="background-color: white;"> a arqueologia do saber a uma genealogia que explica a formação do saber a partir das práticas de poder”.</span></div>
Duanne Ribeirohttp://www.blogger.com/profile/06600234935785310864noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-1101384088693234629.post-65061621851442671582012-07-21T19:20:00.001-07:002012-07-21T19:23:57.921-07:00"...cada um deles detém alguma plausibilidade"<div style="text-align: justify;">
<span style="background-color: white;">"Assim, se discute naturalmente qual desses dois pontos de vista devemos adotar, visto que cada um deles detém alguma plausibilidade. Ora, diante de um conflito de opiniões a atitude adequada é, sem dúvida, tomar os dois pontos de vista na sua clara distinção e definir até que ponto e de que maneira cada um é verdadeiro."</span></div>
<br />
<div style="text-align: right;">
do livro IX da <i>Ética a Nicômaco</i>, de Aristóteles, na tradução de Edson Bini</div>Duanne Ribeirohttp://www.blogger.com/profile/06600234935785310864noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-1101384088693234629.post-73122001444854431112011-10-18T20:55:00.000-07:002011-10-18T20:59:44.069-07:00Astrologia, Marxismo e Psicanálise: Pseudociências?<div style="text-align: justify;">
"Pode-se dizer, resumidamente, que o critério que define o <i>status</i> científico de uma teoria é sua capacidade de ser refutada ou testada. (...) Posso exemplificar o que acabo de afirmar com a ajuda das diversas teorias já mencionadas. A teoria da gravitação de Einstein satisfazia nitidamente o critério da "refutabilidade". Mesmo se, naquela época, nossos instrumentos não nos permitiam ter plena certeza dos resultados dos testes, existia claramente a possibilidade de refutar a teoria.</div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
A astrologia não passou no teste. Os astrólogos estavam muito impressionados e iludidos com aquilo que acreditavam ser evidência confirmadora — tanto assim que pouco se preocupavam com qualquer evidência desfavorável. Além disso, tornando suas profecias e interpretações suficientemente vagas eram capazes de explicar qualquer coisa que possivelmente refutasse sua teoria se ela e as profecias fossem mais precisas. Para escapar à falsificação, destruíram a "testabilidade" de sua teoria. É um truque típico do adivinhador fazer predições tão vagas que dificilmente falham: se tornam irrefutáveis.</div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
Apesar dos esforços sérios de alguns de seus fundadores e seguidores, a teoria marxista da história tem ultimamente adotado essa mesma prática dos adivinhadores. Em algumas de suas formulações anteriores (como, por exemplo, na análise de Marx sobre o caráter da "revolução social vindoura"), as predições eram "testáveis" e foram refutadas. Mas em vez de aceitar as refutações, os seguidores de Marx reinterpretaram a teoria e a evidência para fazê-la concordar entre si. Salvaram assim a teoria da refutação, mas ao preço de adotar um artifício que a tornou de todo irrefutável. Provocaram, assim, uma distorção "convencionalista" destruindo-lhes as anunciadas pretensões a um padrão científico.</div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
As duas teorias psicanalíticas pertencem a outra categoria, por serem simplesmente não "testáveis" e irrefutáveis. Não se podia conceber um tipo de comportamento humano capaz de contradizê-las. Isso não significa que Freud e Adler estivessem de todo errados. Pessoalmente, não duvido da importância de muito do que afirmam e acredito que algum dia essas afirmações terão um papel importante numa ciência psicológica "testável". Contudo, as "observações clínicas", da mesma maneira que as confirmações diárias encontradas pelos astrólogos, não podem mais ser consideradas confirmações da teoria, como acreditam ingenuamente os analistas. Quanto à epopeia freudiana do Ego, Supergo e Id, não se pode reinvidicar para ela um padrão científico mais rigoroso do que o das estórias de Homero sobre o Olimpo. Essas teorias descrevem fatos, mas à maneira de mitos: sugerem fatos psicológicos interessantes, mas não de maneira testável."<br />
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: right;">
do primeiro capítulo de <a href="http://pt.scribd.com/doc/52038890/POPPER-Conjecturas-e-Refutacoes"><i>Conjecturas e Refutações</i>, de Karl Popper</a>.</div>Duanne Ribeirohttp://www.blogger.com/profile/06600234935785310864noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-1101384088693234629.post-24665855457501289702011-09-07T19:48:00.000-07:002012-02-23T15:48:19.764-08:00Da Percepção da Incongruência<div style="text-align: justify;">
"Numa <a href="http://psychclassics.yorku.ca/Bruner/Cards/">experiência psicológica</a> que merece ser melhor conhecida fora de seu campo original, Bruner e Postman pediram a sujeitos experimentais para que identificassem uma série de cartas de baralho, após serem expostos a elas durante períodos curtos e experimentalmente controlados. Muitas das cartas eram normais, mas algumas tinham sido modificadas, como, por exemplo, um seis de espadas vermelho e um quatro de copas preto. Cada sequência experimental consistia em mostrar uma única carta a uma única pessoa, numa série de apresentações cuja duração crescia gradualmente. Depois de cada apresentação, perguntava-se a cada participante o que ele vira. A sequência terminava após duas identificações corretas sucessivas.</div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
Mesmo nas exposições mais breves muito indivíduos identificavam a maioria das cartas. Depois de um pequeno acréscimo no tempo de exposição, todos os entrevistados identificaram todas as cartas. No caso das cartas normais, essas identificações eram geralmente corretas, mas as cartas anômalas eram quase sempre identificadas como normais, sem hesitação ou perplexidade aparentes. Por exemplo, o quatro de copas preto era tomado pelo quatro de espadas ou de copas. Sem qualquer consciência da anomalia, ele era imediatamente adaptado a uma das categorias conceituais preparadas pela experiência prévia. Não gostaríamos nem mesmo de dizer que os entrevistados viam algo diferente daquilo que identificavam. Com uma exposição maior das cartas anômalas, os entrevistados começaram então a hesitar e a demonstrar consciência da anomalia. Por exemplo, frente ao seis de espadas vermelho, alguns disseram: isto é um seis de espadas, mas há algo de errado com ele — o preto tem um contorno vermelho. Uma exposição um pouco maior deu margem a hesitações e confusões ainda maiores até que, finalmente, algumas vezes de modo repentino, a maioria dos entrevistados passou a fazer a identificação correta sem hesitação. Além disso, depois de repetir a exposição com duas ou três cartas anômalas, já não tinham dificuldade com as restantes.<br />
<br />
Contudo, alguns entrevistados não foram capazes de realizar a adaptação de suas categorias que era necessária. Mesmo com um tempo médio de exposição quarenta vezes superior ao que era necessário para reconhecer as cartas normais com exatidão, mais de dez por cento das cartas anômalas não foram identificadas corretamente. Os entrevistados que fracassaram nessas condições experimentavam muitas vezes uma grande aflição. Um deles exclamou: 'não posso fazer a distinção, seja lá qual for. Desta vez nem parecia ser uma carta. Já não sei sua cor, nem se se é de espadas ou de copas. Não estou seguro nem mesmo a respeito do que é uma carta de copas. Meu deus!'."<br />
<br />
<br />
<div style="text-align: right;">
do capítulo 5 de <i>A Estrutura das Revoluções Científicas</i>, de Thomas S. Kuhn</div>
</div>Duanne Ribeirohttp://www.blogger.com/profile/06600234935785310864noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-1101384088693234629.post-71642393227661718292011-08-18T11:45:00.000-07:002011-08-21T11:09:48.900-07:00Raahhhk!<a onblur="try {parent.deselectBloggerImageGracefully();} catch(e) {}" href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEi9JrUCBzye2TZduAE7XqLka2iaTIV7LpaN4GveeVjD_Yv4uixg8Vh-DFsfSbCu_lMmYQjNDZffOJVxA-rBZlgFOhE0XOQNcmFD9H5LJ1VZMkrCD4n-5sTUexdtMXPSctT1nNDmdpPJ0Fn7/s1600/20110817.gif"><img style="display:block; margin:0px auto 10px; text-align:center;cursor:pointer; cursor:hand;width: 364px; height: 400px;" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEi9JrUCBzye2TZduAE7XqLka2iaTIV7LpaN4GveeVjD_Yv4uixg8Vh-DFsfSbCu_lMmYQjNDZffOJVxA-rBZlgFOhE0XOQNcmFD9H5LJ1VZMkrCD4n-5sTUexdtMXPSctT1nNDmdpPJ0Fn7/s400/20110817.gif" alt="" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5642270116497886610" border="0" /></a>Tirinha <a href="http://www.smbc-comics.com/index.php?db=comics&id=2340">daqui</a>. Lembra um pouco a última das tirinhas do Sidney Harry <a href="http://malditosgregos.blogspot.com/2010/04/ciencia-ri.html">nesse post</a>.
<br />
<br />Sobre linguagem e animais, leia "<a href="http://malditosgregos.blogspot.com/2010/06/notas-do-ensaio-sobre-origem-das.html">Notas do 'Ensaio Sobre a Origem das Línguas'</a>".
<br />Duanne Ribeirohttp://www.blogger.com/profile/06600234935785310864noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-1101384088693234629.post-30127725128269396002011-08-05T19:55:00.000-07:002012-02-23T15:48:35.474-08:00Para ler os homens<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
"(...) há um outro ditado que ultimamente não tem sido compreendido, graças ao qual os homens poderiam realmente aprender a ler-se uns aos outros, se se dessem ao trabalho de fazê-lo: isto é, <i>Nosce te ipsum</i>, <i>Lê-te a ti mesmo</i>. (...) Pretendia ensinar-nos que, a partir da semelhança entre os pensamentos e paixões dos diferentes homens, quem quer que olhe para dentro de si mesmo, e examine o que faz quando <i>pensa</i>, <i>opina</i>, <i>raciocina</i>, <i>espera</i>, <i>receia</i>, etc., e por que motivos o faz, poderá por esse meio ler e conhecer quais são os pensamentos e paixões de todos os outros homens, em circunstâncias idênticas. <br />
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
Refiro-me à semelhança das <i>paixões</i>, que são as mesmas em todos os homens, <i>desejo</i>, <i>medo</i>, <i>esperança</i>, etc., e não à semelhança dos <i>objetos</i> das paixões, que são as coisas <i>desejadas</i>, <i>temidas</i>, <i>esperadas</i>, etc. Quanto a estas últimas, a constituição individual e a educação de cada um são tão variáveis, e tão fáceis de ocultar a nosso conhecimento, que os caracteres do coração humano, emaranhados e confusos como são, devido à dissimulação, à mentira, ao fingimento e às doutrinas errôneas, só se tornam legíveis para quem investiga os corações. E, embora por vezes descubramos os desígnios dos homens através de suas ações, tentar fazê-lo sem compará-las com as nossas, distinguindo todas as circunstâncias capazes de alterar o caso, é o mesmo que decifrar sem ter uma chave, e deixar-se as mais das vezes enganar, quer por excesso de confiança ou por excesso de desconfiança, conforme aquele que lê seja um bom ou um mal homem."</div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: right;">
<span class="Apple-style-span">da introdução do <i>Leviatã</i>, de Hobbes</span></div>Duanne Ribeirohttp://www.blogger.com/profile/06600234935785310864noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-1101384088693234629.post-27954321876807265452011-02-08T16:19:00.000-08:002012-08-05T20:22:48.861-07:00Espinoza Clariceano<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Benjamin Moser explora, na biografia <i>Clarice,</i>, relações possíveis entre a escritora brasileira Clarice Lispector e o filósofo Baruch Spinoza. Em seu primeiro livro, Clarice empresta muitos conceitos de Spinoza, ideias que ecoariam, segundo Moser, em toda a sua produção. Temas da metafísica, como a imortalidade da alma e a natureza de deus, são tratados na biografia, que transcrevo abaixo.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
===<br />
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
"Nos escritos de Clarice Lispector há ecos de outro grande pensador judeu, outro fruto do exílio, que encarou a morte de Deus e buscou recriar um universo moral em Sua ausência. Graças à descoberta tardia, na biblioteca de Clarice Lispector, de uma antologia francesa de Espinoza, a conexão não se mostra meramente especulativa, ou o possível resultado de uma coincidência de circunstâncias históricas. O livro traz anotações e a data 14 de fevereiro de 1941, inscrita à mão. Mesmo sem essa informação, o romance que ela inicia em março de 1942,<span class="apple-converted-space"> </span><i>Perto do Coração Selvagem</i>, torna óbvio que ela lera Spinoza com atenção.<span class="Apple-style-span" style="font-family: 'Arial Unicode MS';"> </span><br />
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
'Que exigissem dele artigos sobre Espinoza, mas que não fosse obrigado a advogar, a olhar e a lidar com aquelas pessoas afrontosamente humanas, desfilando, expondo-se sem vergonha', começa dizendo uma longa passagem. (“Ele” é o estudante de direito Otávio, o futuro marido da protagonista, Joana.) Ele faz anotações:<span class="Apple-style-span" style="font-family: 'Arial Unicode MS';"> </span></div>
<div class="MsoBodyTextIndent">
</div>
<blockquote style="text-align: justify;">
O cientista puro deixa de crer no que gosta, mas não pode impedir-se de gostar do que crê. A necessidade de gostar: marca do homem. — Não esquecer: “o amor intelectual de Deus” é o verdadeiro conhecimento e exclui qualquer misticismo ou adoração. — Muitas respostas encontram-se em afirmações de Spinoza. Na ideia por exemplo de que não pode haver pensamento nem extensão (modalidade de Deus) e vice-versa, não está afirmada a mortalidade da alma? É claro: mortalidade como alma distinta e raciocinante, impossibilidade clara da forma pura dos anjos de São Tomás. Mortalidade em relação ao humano. Imortalidade pela transformação da natureza. — Dentro do mundo não há lugar para outras criações. Há apenas oportunidade de reintegração e continuação. Tudo o que poderia existir, já existe. Nada mais pode ser criado senão revelado.</blockquote>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Essa passagem é digna de nota em vários aspectos. Para começar, não é lá muito bem digerida: algumas partes são tiradas quase textualmente das anotações no final de seu exemplar de Spinoza ('Dentro do mundo não há lugar para outras criações. Há apenas oportunidade de reintegração e continuação. Tudo o que poderia existir, já existe', por exemplo). Embora por algum motivo isso tenha fugido à atenção de seus muitos comentadores, é com folga a mais longa citação encontrável em seu extenso corpo de escritos, que de resto incluem apenas um punhado de citações, raramente mais do que uma ou duas frases. A exposição seca não é usual, uma explicação em <i>staccato</i> interessante também porque, em poucas linhas, oferece uma lista de muitas preocupações filosóficas que Clarice, ao longo da vida, iria animar e ilustrar de modo tão vívido. <br />
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
A lista prossegue: </div>
<div class="MsoBodyTextIndent">
</div>
<blockquote style="text-align: justify;">
Se, quanto mais evoluído o homem, mais procura sistematizar, abstrair e estabelecer princípios e leis para sua vida, como poderia Deus — em qualquer acepção, mesmo na do Deus consciente das religiões — não ter leis absolutas pela sua própria perfeição?</blockquote>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Clarice frequentemente zombará desse 'Deus consciente das religiões', mas apenas porque ele ansiava tão desesperadamente pela mesma perfeição e convicção que Spinoza, ele também, rejeitara como algo impossível. </div>
<div class="MsoBodyTextIndent" style="text-align: justify;">
</div>
<blockquote style="text-align: justify;">
Um Deus dotado de livre-arbítrio é menos que um Deus de uma só lei. Do mesmo modo por que tanto mais verdadeiro é um conceito quanto ele é um só e não precisa transformar-se diante de cada caso particular. A perfeição de Deus prova-se mais na impossibilidade do milagre do que na sua possibilidade. Fazer milagres, para um Deus humanizado das religiões, é ser injusto — milhares de pessoas precisam igualmente e ao mesmo tempo desse milagre — ou reconhecer um erro, corrigindo-o — o que, mais do que uma bondade ou “prova de caráter”, significa ter errado. — Nem o entendimento nem a vontade pertencem à natureza de Deus, diz Spinoza. Isso me faz mais feliz e me deixa mais livre. Porque a existência de um Deus consciente nos torna horrivelmente insatisfeitos.</blockquote>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
(...) Ela conclui com uma das frases mais famosas de Spinoza, uma frase pela qual <i>Perto do Coração Selvagem</i>, com sua ênfase na energia animal que pulsa no universo, poderia ter sido lido como uma metáfora poética ampliada: 'No topo do estudo colocaria <i>in litteris</i> Spinoza traduzido: "Os corpos se distinguem uns dos outros em relação ao movimento e ao repouso, à velocidade e à lentidão e não em relação à substância"'. O envolvimento filosófico de Clarice com Spinoza não era uma questão de copiar frases para em seguida esquecê-las. Os pensamentos dele seriam incorporados aos seus, e embora ela não viesse a citá-lo de novo com a mesma extensão, frases espinosianas ocorrem periodicamente em sua obra. <i>O lustre</i>, seu segundo romance, também contém uma quase citação de Spinoza: 'Para nascer as coisas precisam ter vida, pois nascer é um movimento — se disserem que o movimento é necessário apenas à coisa que faz nascer e não à nascida não é certo porque a coisa que faz nascer não pode fazer nascer algo fora de sua natureza e assim sempre se dá nascimento a uma coisa de sua própria espécie e assim com movimentos também'. Em seu terceiro romance, <i>A cidade sitiada</i>, encontramos a linha 'Não havia erro possível — tudo o que existia era perfeito — as coisas só começavam a existir quando perfeitas'. Ela repetiu isso duas décadas depois, em <i>Uma aprendizagem ou o livro dos prazeres</i>: 'Tudo o que existia era de uma grande perfeição'. </div>
<div class="MsoNormal">
<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
--- <br />
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<o:p></o:p></div>
<div class="MsoBodyText" style="text-align: justify;">
Essas ideias podem parecer obscuras, mas Clarice voltou a seu exemplar de Spinoza muitas vezes nos anos seguintes. Seria só pelos conceitos ou seria a busca de um modelo filosófico e moral? Tal como retratado por Arnold Zweig, que escreveu a longa introdução da edição de Spinoza de Clarice (...), Spinoza era um santo secular. Suas exortações para que o indivíduo se mantenha fiel a sua própria natureza teriam ressonância em Clarice; seu “grandioso panteísmo exerceu uma influência particular sobre poetas e pessoas de natureza poética, e sobre aquelas de temperamento fáustico'. <br />
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
(...) eles compartilhavam certas similaridades biográficas importantes. Os pais de Spinoza eram judeus exilados de Portugal que tinham chegado a Amsterdam dez anos antes do seu nascimento. Ele perdeu a mãe quando tinha seis anos e passaria o resto da vida a pranteá-la. (Arnold Zweig atribuía a famosa fórmula de Spinoza: “<i>Deus sive natura</i>” — Deus, isto é, a natureza — a essa perda prematura. A ideia “elevamágica e misticamente a um princípio do mundo essa aliança e esse casamento, cuja destruição tinha sido a estrela negra de sua infância”.) Ambos perderam o pai quando tinha vinte anos, e ambos abandonaram o judaísmo organizados após a morte do pai. Ambos se frustraram em seu primeiro amor, <a href="http://bravonline.abril.com.br/conteudo/literatura/clarice-lispector-infelicidade-inspiradora-510195.shtml">Clarice por Lúcio Cardoso</a>, e Spinoza, pela filha de seu professor. E ambos impressionavam os outros por seu caráter 'aristocrático' e, significantemente, 'estrangeiro'. <br />
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Talvez essas similaridades tenham atraído Clarice para o grande filósofo em quem ela encontrava uma confirmação de sua própria rejeição do 'Deus humanizado das religiões', aquele Deus consciente que se imiscui ativamente nos assuntos humanos. Deve ter surgido como um alívio para ela, cuja vida a tinha tornado consciente do absurdo de se fiar em milagres ou em qualquer outra intervenção. 'A ideia de um Deus consciente é terrivelmente insatisfatória', ela escreveu.<br />
<br /></div>
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Real era a eminência divina que se manifestava na natureza animal amoral, no 'coração selvagem' que animava o universo. Para Spinoza, como para Clarice Lispector, a fidelidade a essa natureza divina interior era a meta mais nobre de todas.</div>
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[em Clarice] (...) vemos a inequívoca marca de Spinoza, que iguala a Natureza a Deus, e ambos, a uma ausência de bem e mal. 'Todas as coisas que estão na Natureza são ou coisas ou ações. Ora, o bem e o mal não são nem coisas nem ações. Portanto o bem e o mal não existem na Natureza', escreveu ele. Como filha da Natureza, Joana não é boa nem má, e não parece sequer estar ciente dessas categorias. Como Joana, a Natureza tem atributos 'positivos', liberdade, por exemplo, ao lado dos 'negativos': Joana é violenta, desonesta, agressiva. <br />
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Uma concepção espinosiana da Natureza resulta em que as mesmas regras que se aplicam ao homem aplicam-se igualmente a Deus, que não é mais um ser moral, preso a noções de bem e mal, interferindo em assuntos humanos, recompensando e punindo, mas uma categoria filosófica equivalente à Natureza. Não é mais 'o Deus humanizado das religiões', que Spinoza também chama de 'superstição' e 'ideias inadequadas', e que teria triunfado não fosse pela 'matemática, que não está preocupada com os fins, mas apenas com as essências e propriedades dos números, [mostrando aos] homens um novo padrão de verdade'. <br />
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(...) Joana leva adiante sua concepção espinosiana. Assim como não há separação significativa entre homem e animal, entre Joana e o gato e a víbora, tampouco o homem ou o animal está separado de Deus, a singular, infinita e eterna 'uma só substância' que é sinônimo de Natureza: uma só substância em constantes transição, encadeada por uma infinita corrente e efeito."</div>Duanne Ribeirohttp://www.blogger.com/profile/06600234935785310864noreply@blogger.com3tag:blogger.com,1999:blog-1101384088693234629.post-1135203816693836852010-07-17T16:12:00.000-07:002012-07-23T16:41:06.220-07:00Professores<div style="text-align: justify;">
Acredito que o de mais importante que se pode aprender de uma pessoa inteligente não é, a princípio, o conhecimento que ele tem sobre os assuntos de que gosta de falar; mas sim seu <i>modo de pensar</i> as coisas que pensa. O jeito com que aborda os assuntos, as coisas que se obriga a tentar perceber neles. Quando, por exemplo, <a href="http://pt.wikipedia.org/wiki/Jo%C3%A3o_Adolfo_Hansen">João Adolfo Hansen</a>, enquanto expõe um tema de forma mansa, escapa por uma digressão, afirma qualquer coisa e pergunta se aquilo pode ser do jeito que afirmou, geralmente reconsidera e diz: <i>sim, por que não? </i>— e aqui já ensinou algo mais útil a longo prazo do que o conteúdo do curso. Da maneira que vejo, é a procura pelo argumento contrário; procura deliberada pelo que me contradiz. Não é perguntar: "Por que é que o que eu digo está certo?", porque já estamos convencidos e repassar os dados só vai nos persuadir mais. É <a href="http://www.marioprataonline.com.br/obra/literatura/adulto/benedito/verbetes/chamar_na_chincha.htm">chamar</a> a certeza <a href="http://www.marioprataonline.com.br/obra/literatura/adulto/benedito/verbetes/chamar_na_chincha.htm">na chincha</a>. Equivale a perguntar: "Por que é que <i>outra coisa</i> não está certa, no lugar dessa?".</div>
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Hansen não foi exatamente meu professor, mas eu assisti a (parte de) algumas aulas. Em uma delas, ele também contou como desenvolveu um de seus trabalhos, sobre Gregório de Matos. Distante da obra do baiano, percorreu a obra várias vezes garimpando as palavras principais, para depois descobrir o que é que significavam para quem as dizia na época. Remontou assim o universo de pensamento de uma pessoa que morrera há séculos: para determinado poema e determinada expressão, tais e tais significados ficavam excluídos, havia o <i>por que não</i> claro direcionando a análise para a interpretação mais acertada. Isso leva a outra coisa que aprendi além do conteúdo do curso nesse primeiro semestre de Filosofia. Creio que a pergunta que faz a passagem entre o que acabei de dizer e o que pretendo é: <i>por que é que alguém deveria se importar em entender o universo de pensamento de alguém que morreu há séculos?</i></div>
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<i><br />
</i></div>
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Mas antes de eu passar à outra ideia, repare em uma coisa: você leu a pergunta anterior e<i> se fez a pergunta</i> ou leu e seguiu adiante? Quero dizer, você tem qualquer resposta para: <i>por que se deve dar atenção ao pensamento velho morto arcaico obsoleto de outras épocas?</i> Nesse <a href="http://malditosgregos.blogspot.com/2010/06/notas-do-ensaio-sobre-origem-das.html">outro texto</a>, eu também fiz isso: pedi que o leitor desocupado pensasse algo. Roubei a atitude do professor <a href="http://www.fflch.usp.br/df/site/professores/moacyrnovaes.php">Moacyr Novaes</a>. Avançando pelo início das <i>Meditações</i>, de Descartes, eis que sugere que façamos a nós mesmos as mesmas perguntas que se colocou o filósofo francês. Para que se saía do piloto automático. Coisas assim: <i>o que seria uma filosofia primeira, um conhecimento do qual dependessem todos os outros? </i>Ou: o que são <i>meditações</i>, que é <i>meditar</i> sobre algo? </div>
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<br /></div>
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Moacyr executa uma variação do detalhismo do Hansen, se você pensar. Com essas duas últimas questões, não passamos nem à primeira página do livro: ler <i>devagar</i> é outra coisa que se aprende. Pode ser irritante, cansativo e frustante caminhar às vezes frase à frase, parágrafo à parágrafo, mas vê-se o livro encorpar, atingir uma imagem mais completa a cada investida. E cada vez menos entendemos o que o escritor diz pelo que já sabemos e pelo que há no nosso próprio universo de pensamento, e cada vez mais nos aproximamos (talvez) do que ele realmente quis dizer, das consequências, filiações e deficiências do que quis dizer. Estudando a filosofia política de Locke, foi isso que <a href="http://www.fflch.usp.br/df/site/professores/albertoribeiro.php">Alberto Ribeiro</a> nos fez notar: em que situação histórica Locke dizia o que dizia? Contra quem ele falava, quais eram seus adversários políticos, quais ideias queria derrubar? </div>
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<br /></div>
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Dito isso, a ideia que eu me lembrava lá acima retiro do professor <a href="http://www.fflch.usp.br/df/site/professores/pedropaulo.php">Pedro Paulo Pimenta</a>: o que há nos vazios entre épocas, pensadores e ciências? Isto é: de uma ciência a outra, ambas tratando de uma mesmo assunto — assim como o entendimento de um mesmo objeto por épocas e pensadores distintos — há a <i>perda</i> de certa percepção — e o <i>ganho</i> de certa percepção. O significado de avanço aqui fica difuso; o progresso agrega elementos, mas desintegra outras partes. A resposta àquela pergunta passa, portanto, por repelir os adjetivos <i>arcaico velho morto</i>, pois nada em pensamento seria completamente desprezível, sendo todas as coisas em pensamento modos incompletos de perceber. Pedaços de conclusão. Monta-se um quebra-cabeça no fim das contas, avaliando a cada momento os prós e contras. <a href="http://malditosgregos.blogspot.com/2010/03/o-que-mantem-filosofia-viva.html">Não existe manual</a>.</div>
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São principalmente coisas fáceis de lembrar, posso colocar até de uma forma autoajuda: <i>regra do 'por que não?'</i>, <i>regra do 'se colocar a pergunta'</i>, <i>regra da leitura lenta</i> (ou cuidadosa), <i>lei do progresso como perda de algo e ganho de outro algo</i>. Coisas que ajudam a escapar do raciocínio próprio, do próprio universo engessado de pensamento. Outras pessoas dirão essas coisas que estou dizendo de outras forma: Terence Mckenna, por exemplo, dirá que a cultura (esse <i>universo</i> que cito) de cada um de nós é um <a href="http://www.youtube.com/watch?v=DVkNtx6Mi2A&">sistema operacional</a>. A metáfora permite dizer: programas não-compatíveis não rodam nesse sistema, não são sequer compreensíveis por ele; isto é, há opiniões ou fatos ou verdades que seriam cifras para você, simplesmente porque você não <i>pode</i> entendê-las.</div>Duanne Ribeirohttp://www.blogger.com/profile/15758610155848080935noreply@blogger.com3tag:blogger.com,1999:blog-1101384088693234629.post-7246981712000897632010-07-01T19:22:00.000-07:002010-07-01T19:24:52.029-07:00A Linguagem Pré-Linguística das Flores<div style="text-align: justify;">Há um paralelo interessante que se pode fazer entre o <i>Ensaio sobre a Origem das Línguas</i>, de Jean-Jacques Rousseau, e <i>A Brincadeira</i>, romance de Milan Kundera. O filósofo francês, interessado em saber como surgiu a língua e a linguagem, especula sobre o homem em seus primórdios, antes de qualquer convenção, e se convence de que:</div><blockquote style="text-align: justify;">"<i>(...) Apesar de serem a linguagem do gesto e a da voz igualmente naturais, a primeira, todavia, parece mais fácil e depende menos de convenções, porquanto um maior número de objetos impressiona antes nossos olhos do que nossos ouvidos, e as figuras apresentam maior variedade do que os sons, mostrando-se também mais expressivas e dizendo mais em menos tempo. O amor, dizem, foi o inventor do desenho; pôde também inventar a palavra, porém com menor felicidade. Pouco satisfeito com ela, despreza-a; possui maneiras mais vivas para se exprimir. Quanto dizia a seu amante aquela que com tanto prazer traçava a sua sombra! Que sons poderia empregar para traduzir esse movimento do braço?</i>" [<i>Ensaio sobre a Origem das Línguas</i>, Capítulo I]</blockquote><div style="text-align: justify;">A passagem tem força precisamente pela imagem que cria (algo a que Rousseau levará nossa atenção nos capítulos seguintes do livro); primeiro, faz alusão ao amor, a toda carga afetiva presente na enamorada que se declara ao enamorado. Segundo, a descrição do contornar da sombra é sutilmente poética. Toda a capacidade literária do filósofo seduz nosso entendimento, não? Sentimo-nos dispostos a concordar com a sua proposta de gênese da linguagem. Sem julgar o mérito da tese, avancemos à Kundera. Em <i>A Brincadeira</i>, há outra imagem, de ideia e teoria similar: </div><blockquote style="text-align: justify;">"<i>(...) em cada um de nossos encontros um buquê me esperava, e acabei acostumando-me, porque a espontaneidade do presente me desarmava e porque compreendi que Lucie gostava dessa forma de presentear; sofria talvez com a pobreza de sua eloquência e via nas flores uma maneira de falar; <b>não segundo o pesado simbolismo</b> da antiga linguagem das flores, mas sim num sentido ainda mais arcaico, mais nebuloso, mais instintivo, <b>pré-linguístico</b>; talvez, tendo sempre preferido calar-se em vez de falar, Lucie sonhasse com o tempo em que, não existindo as palavras, as pessoas conversavam por meio de pequenos gestos: com o dedo mostravam uma árvore, riam, tocavam um ao outro...</i>" [<i>A Brincadeira</i>, terceira parte, capítulo 9, <b>grifo nosso</b>]</blockquote><div style="text-align: justify;">Há aqui também a sugestão de um estado prévio em que, "não existindo as palavras, as pessoas conversavam por meio de pequenos gestos", e depois segue também a descrição de uma alegria que é simples e bela por esse mesmo motivo. No trecho, a namorada do personagem, Lucie, escolhe um método mudo para expressar sua afeição; não contorna sua sombra, mas lhe entrega flores, sem o simbolismo pesadíssimo e sem levar em conta a convenção social que diz que quem dá flores são os homens. Um expressar de sentido instintivo, nebuloso e arcaico. Porém, Kundera se distancia muito de Rousseau quando diz que Lucie gostava de assim se dizer pois sua eloquência era pobre: para o francês, é precisamente saber ser eloquente o que ela faz.</div><blockquote style="text-align: justify;">"<i>(...) se fala aos olhos muito melhor do que aos ouvidos. (...) Compreende-se mesmo que os discursos mais eloquentes são aqueles em que se introduz o maior número de imagens e os sons nunca possuem maior energia do que quando fazem o efeito das cores. (...) Entretanto, a linguagem mais expressiva é aquela em que o sinal diz tudo antes que se fale.</i>" [<i>Ensaio sobre a Origem das Línguas</i>, Capítulo I]</blockquote><div style="text-align: justify;">Voltando à Kundera, vê-se em uma, por assim dizer, insignificância do cotidiano, a potência máxima de expressividade, resquício da língua original nos dias degradados de hoje. Em outro momento, o romancista tcheco vai destacar o irrelevante na relação amorosa: "Os momentos decisivos na evolução do amor nem sempre procedem de acontecimentos dramáticos, muitas vezes são decorrentes de circunstâncias que são à primeira vista perfeitamente insignificantes". E isso talvez seja porque compõem imagens que dizem muito mais do que qualquer <i>eu te amo</i> seria capaz de dizer.</div>Duanne Ribeirohttp://www.blogger.com/profile/15758610155848080935noreply@blogger.com3tag:blogger.com,1999:blog-1101384088693234629.post-64871428593606721662010-06-17T11:47:00.000-07:002010-07-01T19:25:08.503-07:00Notas do "Ensaio sobre a Origem das Línguas"<div style="text-align: justify;">Lourival Gomes Machado, que fez notas para o <i>Ensaio sobre a Origem das Línguas</i>, de Jean-Jacques Rousseau, a certa altura, nos deixa de sobreaviso sobre a tolice do filósofo francês. Na edição de <i>Os Pensadores</i> (1999), na nota 3, página 263, ela diz: "Concluindo anteriores desenvolvimentos, aqui se rejeita em definitivo qualquer explicação meramente fisiológica da comunicação pela linguagem. Assim se afirma a origem social da linguagem, tal como hoje a aceitam a psicologia e a sociologia atuais. Embora se sigam, na passagem, alguns equívocos de ordem zoológica, não chegam eles a invalidar a afirmação básica — "a língua de convenção só pertence ao homem". Antes que eu siga em frente, considere essa última frase e a ideia de que os homens começam a falar porque estão em sociedade, sem necessidade da língua se não há convívio. Considere.</div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">Leve quanto tempo precisar, que não vou tratar disso hoje. Quero reparar um engano do comentador. Quando ela diz que Rousseau comete "alguns equívocos de ordem zoológica", ela se refere a esse trecho:</div><blockquote><div style="text-align: justify;">"<i>Parece, ainda, pelas mesmas observações, que a invenção da arte de comunicar nossas ideias depende menos dos órgãos que nos servem para tal comunicação do que de uma faculdade própria do homem, que o faz empregar seus órgãos com o mesmo fim. Dai ao homem uma organização tão grosseira quanto possais imaginar: induvitavelmente, adquirirá menos ideias, mas, desde que haja entre ele e seus semelhantes qualquer meio de comunicação pelo qual um possa agir e o outro sentir, acabarão afinal por comunicar todas as ideias que possuem.</i></div></blockquote><blockquote><div style="text-align: justify;"><i>"Os animais dispõem, para essa comunicação, de uma organização mais do que suficiente e jamais qualquer deles utilizou-a. Com o que, segundo me parece, se firma uma diferença muito característica. Aqueles animais que trabalham e vivem em comum, como os castores, as formigas e as abelhas, <b>possuem — não duvido — alguma língua natural para se comunicarem entre si</b>. Há mesmo razão para crer-se que a língua dos castores e a das formigas se compõem de gestos, falando somente aos olhos. De qualquer modo, justamente por serem naturais, tanto uma quanto outra dessas línguas não são adquiridas: os animais, que as falam, já as possuem ao nascer; todos as têm e em todos os lugares são as mesmas, absolutamente não as mudam e nelas não conhecem nenhum progresso. A língua de convenção só pertence ao homem e esta é a razão porque o homem progride, seja para o bem ou para o mal, e porque os animais não conseguem. Essa distinção, por si só, pode levar-nos longe.</i>" (<i>Ensaio sobre a Origem das Línguas</i>, Capítulo I; <b>grifo nosso</b>)</div></blockquote><div style="text-align: justify;">Certo, frente a isso, qual é o equívoco zoológico de Rousseau? Pesquisando, é possível saber que as abelhas, que foram citadas pelo filósofo, de fato possuem um esquema de comunicação muito elaborado, que <a href="http://scienceblogs.com.br/discutindoecologia/2009/06/danca_abelhas.php">se dá através de uma dança</a>. Quanto às formigas, também citadas, há um vídeo interessante sobre gestos e comportamento que expressam sentido para elas: certa formiga, infectada por um fungo que poderia destruir a colônia, é afastada antes do parasita se desenvolver, é afastada para a morte no isolamento. As cenas que seguem podem lembrar <i>Alien</i>:</div><br />
<div align="justify"><div style="text-align: center;"><object height="385" width="480"><param name="movie" value="http://www.youtube.com/v/16Zlci-LZOA&hl=pt_BR&fs=1&"></param><param name="allowFullScreen" value="true"></param><param name="allowscriptaccess" value="always"></param><embed src="http://www.youtube.com/v/16Zlci-LZOA&hl=pt_BR&fs=1&" type="application/x-shockwave-flash" allowscriptaccess="always" allowfullscreen="true" width="480" height="385"></embed></object></div></div><br />
<div style="text-align: justify;">Assustador. Bom, além desses, existem as pesquisas sobre chimpanzés, sobre seu <a href="http://super.abril.com.br/mundo-animal/chimpanzes-einsteins-floresta-440091.shtml">aprendizado da nossa linguagem e construção de conhecimento</a>, e também sobre seu <a href="http://noticias.terra.com.br/ciencia/noticias/0,,OI4204364-EI8145,00-Cientistas+tentam+decifrar+a+linguagem+dos+macacos.html">meio próprio de comunicar sentido</a>. Encontra-se também pelo menos duas pesquisas (<a href="http://noticias.terra.com.br/ciencia/interna/0,,OI2165027-EI8145,00.html">aqui</a> e <a href="http://www2.uol.com.br/vivermente/noticias/lingua_dos_golfinhos.html">aqui</a>) sobre a linguagem dos golfinhos. O paralelo rousseauniano vai na direção certa. Nessa última matéria sobre os macacos, repare nesse trecho:</div><blockquote style="text-align: justify;">"<i>Será que grandes primatas e macacos têm uma linguagem secreta que ainda não foi decifrada? E se for o caso, será que isso vai resolver o mistério de como a faculdade humana da linguagem evoluiu? Biólogos abordam o assunto de duas maneiras: tentando ensinar linguagens humanas a chimpanzés e outras espécies, e escutando animais na vida selvagem. A primeira estratégia foi impulsionada pelo desejo intenso das pessoas - talvez reforçado pela exposição infantil a animais falantes em desenhos animados - de se comunicar com outras espécies. Os cientistas dedicaram imenso esforço para ensinar a linguagem a chimpanzés, seja na forma de sons ou de sinais.</i>" [<a href="http://noticias.terra.com.br/ciencia/noticias/0,,OI4204364-EI8145,00-Cientistas+tentam+decifrar+a+linguagem+dos+macacos.html">leia completo</a>]</blockquote><div style="text-align: justify;">Pois é, mas o que é posto como um avanço imprevisto da ciência, na verdade já existia; aqui o que se esquece é uma tradição anterior que já tinha se colocado essas questões. Há outros comentários a serem feitos sobre detalhes desse livro, mas vou postar depois.</div>Duanne Ribeirohttp://www.blogger.com/profile/15758610155848080935noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-1101384088693234629.post-15243873007252053952010-06-08T09:15:00.000-07:002010-06-08T09:41:36.289-07:00O Profeta e os Peixes<div style="text-align: justify;">Imagine que você está em um campo de pesca, sentado, vara lançada à água. Entra então um homem vestido de túnica branca, corda amarrada na cintura, barba alva, crespa, longa, a indumentária de um profeta. Ele chega à frente do mar, invoca as forças da natureza e um peixe salta em direção a uma rede que traz consigo. Faz isso uma vez e outra vez. O que você faz? Como você reage?</div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">Ao que parece, a tendência de reação é o puro fascínio. Como se vê nessa pegadinha do Sílvio Santos:</div><br />
<div style="text-align: center;"><object height="385" width="480"><param name="movie" value="http://www.youtube.com/v/azKRgCkkp0I&hl=pt_BR&fs=1&"></param><param name="allowFullScreen" value="true"></param><param name="allowscriptaccess" value="always"></param><embed src="http://www.youtube.com/v/azKRgCkkp0I&hl=pt_BR&fs=1&" type="application/x-shockwave-flash" allowscriptaccess="always" allowfullscreen="true" width="480" height="385"></embed></object></div><br />
<div style="text-align: justify;">O interessante é que todos só permanecem estáticos no fascínio, no choque. Nenhum deles se move, se levanta para checar o que há naquele lado de mar, nenhum deles faz menção de seguir o personagem, ir escondido ver quem, o que, se é uma armação, todos se aquietam e começam a criar fantasias. O último dos homens do vídeo já usa uma série de referências: <i>profeta</i>, <i>mago</i>... de tal modo que seria engraçado se, no final, o funcionário do programa não lhe dissesse que se tratava de uma câmera escondida. Esse homem contaria à família o que viu, aos amigos, se convenceria de uma série de histórias ou, até mesmo, no pior dos casos, criaria uma religião.</div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">O que você faria na mesma situação?</div>Duanne Ribeirohttp://www.blogger.com/profile/15758610155848080935noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-1101384088693234629.post-58096228676549457792010-06-01T17:45:00.000-07:002012-07-23T16:42:25.659-07:00Comece por aprender sua língua<div style="text-align: justify;">
1. <a href="http://malditosgregos.blogspot.com/2010/03/o-desprezo-ao-amador.html">Nesse</a> post, eu afirmei que, em filosofia, entre o amador e o filósofo há, de fato, uma diferença qualitativa, mas essa variação não se dá entre <i>tipos</i>, mas procedendo através de gradações de um a outro. Lendo Condillac, um filósofo do século 18, encontrei ou penso ter encontrado algum reforço para aquela afirmação, de tal modo a expandi-la a precisões que eu não tinha previsto. Fiz uma seleção de trechos de vários livros que acaba por dizer que só existe uma ferramenta para conhecer qualquer que seja, e ela está presente tanto no filósofo mais rançoso quanto na criança mais ingênua.</div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
2. Para expor qual seja essa ferramenta, na sua <i>Lógica</i>, Condillac evoca o exemplo de uma planície que vemos através de uma janela. Vemos um planície, ao longe, estamos no topo de um castelo e enxergamos tudo o que há lá embaixo. Se nos fosse dado olhar esse panorama por um instante e de súbito nos cobrissem a visão, o que teríamos visto? Se dissessem: "o que há na planície?", poderíamos responder? Você já deve ter a resposta, mas me deixe adicionar um outro exemplo. Levante-se de onde está e abra uma gaveta, ou um armário, ou um livro, olhe só uma vez e não mais, feche. Você poderá dizer o que estava nos móveis ou o que estava escrito? Dificilmente. Agora repita o processo e olhe quanto tempo quiser, diga para si o que viu. E então responda: como foi que você obteve o conhecimento do que estava lá? Ele não lhe veio de uma só vez, como vimos. Então, como veio?</div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
Por partes. Vendo cada coisa de uma vez e depois sabendo todas de uma vez. Condillac diz:</div>
<blockquote style="text-align: justify;">
"(...) O mesmo acontece com a visão do espírito. Eu tenho ao mesmo tempo presente um grande número de conhecimentos que se me tornaram familiares: eu os vejo todos, mas não os distingo do mesmo modo. Para ver de uma maneira distinta tudo o que se oferece ao mesmo tempo ao meu espírito, é preciso que eu decomponha como decompus o que se oferecia a meus olhos, é preciso que eu análise meu pensamento. Esta análise do meu pensamento não se faz de modo diferente da análise dos objetos exteriores. Decompõe-se da mesma maneira: descrevem-se as partes de seu pensamento numa ordem sucessiva, para reestabecê-las numa ordem simultânea." (<i>Lógica</i>, parte 1, Capítulo II)</blockquote>
<div style="text-align: justify;">
3. É essa habilidade, a <i>análise</i>, para Condillac, que está presente em todos e que franqueia nosso acesso a todo conhecimento que podemos ter com consistência.</div>
<blockquote style="text-align: justify;">
"Cada um pode se convencer desta verdade por sua própria experiência; até as pequenas costureiras estão convencidas: pois, se lhes dermos um vestido e lhes propusermos fazer um semelhante, elas imaginarão naturalmente desfazer e refazer esse modelo, para aprender a fazer o vestido que solicitamos. Elas conhecem a análise tão bem quanto os filósofos (...)." (<i>Lógica</i>, parte 1, Capítulo II)</blockquote>
<div style="text-align: justify;">
Ele segue adiante:</div>
<blockquote style="text-align: justify;">
"<i>Existem espíritos sábios que parecem nunca ter estudado, porque parecem nunca ter pensado para instruir. Todavia, fizeram estudos e os fizeram cuidadosamente. Como estudaram sem intenção premeditada, não pensaram em tomar lições com nenhum mestre e tiveram o melhor de todos, a natureza.</i></blockquote>
<blockquote style="text-align: justify;">
"Existem espíritos falsos que fizeram grandes estudos. Eles se vangloriam de possuir bastante método e só raciocinam mal porque o método não é o correto. Quanto mais insistimos num método falso, mais no extraviamos. Tomamos por princípios noções vagas, palavras vazias de sentido; constituímos um jargão científico, no qual acreditamos ter a evidência; e no entanto não sabemos, na verdade, nem o que vemos, nem o que pensamos, nem o que dizemos." (<i>Lógica</i>, parte 1, Capítulo III)</blockquote>
<div style="text-align: justify;">
4. Nesse último trecho, além de dar a análise capacidades além da tradição, ou que prescindam da tradição, Condillac fala de "método falso", "raciocinar mal". Pense aí consigo: o que seria um <i>método falso</i>? Como é que se <i>raciocina mal</i>? Se você se lembrar dos acontecidos em que pensou errado, e se ver as semelhanças entre todos, você terá <i>analisado</i>, e terá ganho um conhecimento que esse post nunca poderá te dar. O filósofo também fala que "<i>não sabemos nem o que vemos, nem o que pensamos, nem o que dizemos</i>". Isso pode ser? Pode ser que eu não saiba o que penso ou o que não saiba o que digo? Novamente, se você se lembrar de casos assim, receberá muito mais.</div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
5. Até esse ponto, a análise foi tratada como presente em todos os campos da vida, como útil e não separável de nenhum de nós. Falamos de mau raciocínio sem nem citar a filosofia. Cá embaixo o tratamento é um passo a frente já nos liga muito mais com o assunto do <a href="http://malditosgregos.blogspot.com/2010/03/o-desprezo-ao-amador.html">outro post</a>. A citação é longa porque é preciso:</div>
<blockquote style="text-align: justify;">
"Quando você estuda uma ciência nova, se ela está bem exposta, os começos devem ser mais fáceis: porque o conduzem do conhecido ao desconhecido. Fazem-no, portanto, encontrar, nos seus conhecimentos, as primeiras coisas que você deve notar, e parece que você as sabia antes de tê-las aprendido.</blockquote>
<blockquote style="text-align: justify;">
Entretanto, quanto mais esse começo é fácil, mais você se apressa em ir mais longe; você entendeu e crê que isso lhe é suficiente. Mas note que você tem uma língua para aprender e que uma língua não se sabe somente pelo fato de ter visto as palavras uma vez: é necessário falá-la, é necessário torná-la familiar. Não se espante, portanto, se, depois de ter entendido um primeiro capítulo, tenha alguma dificuldade em entender o segundo, o qual você percorre muito rapidamente. Continuando dessa maneira, lhe será muito mais difícil, ainda, entender o terceiro. Comece, portanto, lentamente, e tudo lhe será fácil quando o começo lhe for familiar.</blockquote>
<blockquote style="text-align: justify;">
Entretanto, resta uma dificuldade, e ela é grande. Ela advém de que, antes de ter estudado as ciências, você já fala a língua e você a fala mal. Portanto, com exceção de algumas palavras que lhe são novas, a língua das ciências é a sua. Ora, convenha que você fala frequentemente sua língua sem entender o que você diz, ou que você se entende mais ou menos. Isso, entretanto, lhe é suficiente e isso é suficiente aos outros porque eles lhes pagam com a mesma moeda. Parece que, para manter nossas conversações, concordamos tacitamente que as palavras substituem [o valor das] ideias, como o jogo das fichas substitui o do dinheiro; e ainda que haja ao menos um grito contra aqueles que têm a imprudência de jogar, sem estarem informados do valor das fichas, cada um pode impunemente falar sem ter aprendido o valor das palavras. Você quer aprender as ciências com facilidade? Comece por aprender sua língua. (<i>Tratado dos Sistemas</i>, capítulo XVIII)"</blockquote>
<div style="text-align: justify;">
Há aqui um modo de proceder. Algumas especificações de como não raciocinar mal. Nos meus termos, modos de atravessar as gradações do amador ao filósofo.</div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
6. Do amador ao filósofo, ou de uma pessoa menor a uma pessoa maior. Mas para os propósitos desse texto o que foi dito foi suficiente. Termino com Condillac reformulando o que ele disse e sendo ainda mais incisivo:</div>
<blockquote style="text-align: justify;">
"Mas aprender uma língua é familiarizar-se com ela, o que só pode ocorrer pelo efeito de um longo uso. É preciso, então, ler com reflexão, várias vezes, falar sobre o que se leu e reler ainda para se assegurar de haver falado bem. (...)</blockquote>
<blockquote style="text-align: justify;">
Um inconveniente maior é que se compreenderá mal, se fizermos da linguagem da pessoa que estuda, que sempre conservará algo, e da minha, que se acreditará ter captado, um jargão ininteligível. Eis o que acontecerá aos que se creem instruídos (...). De qualquer modo que eles me leiam, ser-lhes-á bem difícil esquecer o que aprenderam para aprender apenas o que ensino; eles desdenharão recomeçar comigo: farão pouco caso da minha obra, se se aperceberem que não a compreendem, e se imaginam comprendê-la, ainda farão pouco caso, porque eles compreenderão à sua maneira e acreditarão não haver aprendido nada. É bem comum, entre os que se julgam sábios, não ver nos melhores livros senão o que eles sabem, e, consequentemente, lê-los sem nada aprender: não veem nada de novo numa obra em que tudo é novo para eles." (<i>Lógica</i>, Capítulo IX)</blockquote>Duanne Ribeirohttp://www.blogger.com/profile/15758610155848080935noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-1101384088693234629.post-2301189708726588772010-05-28T14:11:00.000-07:002010-06-08T09:44:11.566-07:00"Não me admiro..."<div style="text-align: justify;">"(...) da qualidade de minhas respostas podereis compreender que não é nelas, mas nas vossas próprias objeções, que tem raiz aquele fruto que, não sem meu desgosto, poderia talvez amargar-vos em certa parte o gosto: que bem devíeis, Sr. Ingoli (e seja-me permitido, por vossa ingenuidade filosófica e por minha antiga afeição por vós, dizer muito livremente), pondo-vos, como se diz, as mãos no peito, e sabendo consistentemente que Nicolau Copérnico tinha bastante mais anos nessas dificílimas especulações que vós dias consumados, devíeis, digo, aconselhar-vos melhor e não deixar-vos facilmente persuadir de poder aterrar um tal homem e, principalmente, com aquele tipo de armas com as quais o afrontais, que finalmente fazem parte das objeções mais comuns e usuais que se fazem nesta matéria, e se, ainda assim, existir nisso alguma coisa de vosso, esta é de menos eficácia que as outras. Portanto, esperáveis que Nicolau Copérnico não tenha penetrado os mistérios do facílimo <i>Sacrobosco</i>? Que ele não tenha entendido a paralaxe? Que ele não tenha lido e entendido Ptolomeu e Aristóteles? Eu não me admiro que tenhais confiado de poder vencê-lo, pois que tão pouco o estimáveis. Mas se vós o tivésseis lido com toda aquela atenção que vos é necessária para bem entendê-lo, quando não fosse por outra coisa, pelo menos a dificuldade da matéria teria de algum modo atordoado em vós aqueles espíritos contraditórios que, antes de tomar tamanha resolução, vos teríeis refreado e mesmo totalmente abstido."</div><br />
<div style="text-align: right;"><span class="Apple-style-span" style="font-size: x-small;">da </span><i><a href="http://www.scientiaestudia.org.br/revista/PDF/03_03_06.pdf"><span class="Apple-style-span" style="font-size: x-small;">Carta de Galileu a Francesco Ingoli</span></a></i></div>Duanne Ribeirohttp://www.blogger.com/profile/15758610155848080935noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-1101384088693234629.post-1039396564391100632010-04-18T19:17:00.000-07:002011-08-21T11:09:48.901-07:00A Ciência Ri<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="http://www.sciencecartoonsplus.com/gallery/darwin/sharris_darwin26.gif" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img src="http://www.sciencecartoonsplus.com/gallery/darwin/sharris_darwin26.gif" border="0" height="271" width="400" /></a></div><div style="text-align: justify;">Estive lendo <i>A Ciência Ri</i>, coletânea de cartoons de Sidney Harris. Faz graça da ciência, da filosofia, da psicologia, da evolução. No <a href="http://www.sciencecartoonsplus.com/">site do autor</a>, você vê quase todos.
<br /></div><div style="text-align: justify;">
<br /></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="http://www.sciencecartoonsplus.com/gallery/academia/acad02.gif" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img src="http://www.sciencecartoonsplus.com/gallery/academia/acad02.gif" border="0" /></a></div><div style="text-align: justify;">
<br />
<br /></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="http://www.sciencecartoonsplus.com/gallery/academia/acad04.gif" imageanchor="1" style="clear: right; display: inline !important; float: right; margin-bottom: 1em; margin-left: 1em;"><img src="http://www.sciencecartoonsplus.com/gallery/academia/acad04.gif" border="0" height="310" width="400" /></a></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<br /></div><div style="text-align: left;"><a href="http://www.sciencecartoonsplus.com/gallery/biology/bio06.gif" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img src="http://www.sciencecartoonsplus.com/gallery/biology/bio06.gif" border="0" height="400" width="382" /></a></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<br /></div><a href="http://www.sciencecartoonsplus.com/gallery/naturalhistory/nathist21.gif" imageanchor="1" style="clear: right; float: right; margin-bottom: 1em; margin-left: 1em;"><img src="http://www.sciencecartoonsplus.com/gallery/naturalhistory/nathist21.gif" border="0" height="295" width="400" /></a>
<br />
<br />Duanne Ribeirohttp://www.blogger.com/profile/15758610155848080935noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-1101384088693234629.post-67688315777335360872010-03-30T16:58:00.000-07:002010-06-08T09:47:40.366-07:00O Desprezo ao Amador<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">1. Eu escrevi algumas coisas no post anterior (“<a href="http://malditosgregos.blogspot.com/2010/03/o-que-mantem-filosofia-viva.html">O que mantém a Filosofia viva</a>”) que me incomodaram um pouco na releitura. Eu disse: “do alto do meu conhecimento de <i>O Mundo de Sofia</i>”, meio que desprezando. Perguntei se a resposta de alguém era a melhor possível ou “a melhor que ela podia dar <i>pra mim</i>?”, indicando que, adolescente que eu era, houvesse coisas que eu supostamente não poderia entender à época. Também sugeri que a Filosofia <i>de verdade</i> (para mim) não chegava nem perto do “bate-papo engajado cheio de palavras difíceis”, e com isso eu tinha em mente um tipo bem particular de pessoa, que não <i>estudou</i>, mas sabe uma série de termos e um pouco de história (similar ao primeiro trecho que citei, só que aplica a ideia de forma geral). No cerne, eu realizo uma divisão rígida entre <i>filosofia acadêmica</i>, de estudo e pesquisa, e <i>filosofia amadora</i>. Como se fosse impossível para esses ‘amadores’ alcançarem qualquer coisa do primeiro tipo. Mas isso é verdade?</div><div class="MsoNormal" style="text-align: justify;"><br />
</div><div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">2. Antes que eu analise se é ou não, quero saber por que é que essa divisão surgiu no <a href="http://malditosgregos.blogspot.com/2010/03/o-que-mantem-filosofia-viva.html">texto</a>, já que eu a não decidi antes de escrever e ela foi incluída naturalmente, no fluxo da escrita. Em certo nível, ela funciona para valorizar o texto e autor, na medida em que supervaloriza o ensino acadêmico. Porque sou <i>eu</i> que estou fazendo a graduação e sou <i>eu</i> que agora não faço mais parte dos <i>filósofos amadores</i>. É como se eu dissesse: <i>da mesma forma como esse tipo de formação tem valor, tem o meu texto</i>. É uma espécie de falácia, um <i><a href="http://pt.wikipedia.org/wiki/Argumentum_ad_verecundiam">Argumentum</a> <a href="http://pt.wikipedia.org/wiki/Argumentum_ad_verecundiam">Ad</a></i> <i><a href="http://pt.wikipedia.org/wiki/Argumentum_ad_verecundiam">Verecundiam</a></i> (<a href="http://pt.wikipedia.org/wiki/Argumentum_ad_verecundiam">Apelo à Autoridade</a>) difuso. Daí para um: <i>seja como eu</i>. E no parágrafo 4, eu conto algo como uma história de superação. Por outro lado, já que a ideia <i>se</i> escreveu, não a construi premeditadamente, creio que ela já estava há tempos dentro de mim. É evidente, já que crer que sou demasiado amador é uma das coisas que me levaram a fazer o curso. Mas já agora duvido dessa crença e ressignifico a pergunta do outro parágrafo: o <i>quanto</i> amador eu de fato eu era? O quanto isso <i>verdadeiramente</i> me limitava?</div><div class="MsoNormal" style="text-align: justify;"><br />
</div><div class="MsoBodyText" style="text-align: justify;">3. Em um de seus textos, Bernard Shaw sugere que troquemos o <i>ou isso ou aquilo</i> (ou bom ou mal; ou <i>de direita</i> ou <i>de esquerda</i>; etc) por uma visão nivelada: <i>o quanto disso, o quanto daquilo</i>. Pensando sobre o que diferencia o acadêmico do amador, por assim dizer, cheguei a conclusão de que se trata de variação nos níveis dos seguintes aspectos: <i>rigor</i>, <i>disciplina</i>, <i>condições de formação</i> e <i>fontes de informação</i>. Dependendo do nível alto ou baixo de cada um desses termos, o indivíduo vai estar mais ou menos perto do que seja amador e mais ou menos perto do que seja acadêmico. Aqui creio que é melhor refazer uma definição: não há motivo para endeusar <i>a priori</i> o acadêmico. Ter feito a faculdade, entrado e depois saído de lá são e salvo não implica em grande rigor e disciplina, formação e erudição amplas. Já que estamos pensando por níveis, não por categorias estanques, vamos considerar, pelo menos agora, todos como filósofos, mais ou menos próximos do <i>filósofo ideal</i>, ou <i>completo</i>.</div><div class="MsoBodyText" style="text-align: justify;"><br />
</div><div class="MsoBodyText" style="text-align: justify;">4. Creio que essa ideia existia no <a href="http://malditosgregos.blogspot.com/2010/03/o-que-mantem-filosofia-viva.html">outro post</a>, de certa forma. Eu digo: “se não há finalidade assentada, todo currículo vale (...) da mediocridade à excelência, as opções são múltiplas e não há critério para distinguir entre o que seja bom e o que seja ruim, porque não há ideal”. Passo então a falar das condições que permitem que, para o senso comum, filósofo amador e acadêmico (usando os termos que deixamos pra trás) fiquem em pé de igualdade. Por fim, no parágrafo 6, eu defini o que seria o filósofo de excelência. Também já tinha colocado as coisas em escala: “esse conjunto de acepções <b>leva</b> ao que se chama excelência”. Ou seja, é um caminho, do mal feito ao aperfeiçoado. Mas incorri nesses prejuízos que citei, que dão a aparência de imobilidade. Podemos dar um passo adiante do parágrafo 2 do post atual: não me limitava a <i>condição em si</i> de amador, mas como eu a vivia.</div><div class="MsoBodyText" style="text-align: justify;"><br />
</div><div class="MsoBodyText" style="text-align: justify;">5. <i>Rigor</i> é a exigência que se faz para si mesmo de realizar coisas bem acabadas. <i>Disciplina</i> é a adoção de um método e a força para seguir nele. São duas palavras meio empoeiradas e meio aborrecidas, mas você pode escolher as que façam sentido pra você. Sem <i>rigor</i>, todos os textos e análises que eu fizer poderão ter problemas sem que eu perceba; sem <i>disciplina</i>, estarei escrevendo o mesmo, sem evoluir, ou evoluindo por espasmos. Mais importante que os dois, agora, são <i>fontes de informação</i> e <i>condições de formação</i>. As ideias que passam do autor original, são traduzidas pelo tradutor, filtradas pelas várias inteligências, mastigadas pelos divulgadores, simplificadas pelos jornalistas — essas ideias se desfiguram cada vez mais do original. Descartes disse, no <i>Discurso do Método</i>:</div><blockquote style="text-align: justify;">"<i>Não me espantam de modo algum as extravagâncias que se atribuem a todos esses antigos filósofos, nem julgo, por isso, que seus pensamentos tenham sido muito desarrozoados, visto serem os melhores espíritos de seu tempo, mas apenas julgo que nos foram mal relatados. Porque se vê também que quase nunca aconteceu de algum de seus sectários os haja superado: e estou seguro de que os mais apaixonados dos que seguem Aristóteles crer-se-iam felizes se tivessem tanto conhecimento da natureza quanto ele teve, embora sob a condição de nunca o terem maior são como a hera, que não tende a subir mais alto que as árvores que a sustentam, e que muitas vezes torna mesmo a descer, depois de ter chegado ao topo.</i>" </blockquote><div class="MsoBodyText"><o:p></o:p></div><div class="MsoBodyText" style="text-align: justify;">6. Considero que, na universidade, as <i>fontes de informação</i> são certamente mais gabaritadas do que as mais comuns, e haverá estímulo para repetir a leitura e entrar em contato com os originais. Essa é possivelmente o item que mais distinguirá um bom filósofo do mediano. O que eu chamo de <i>condições de formação</i> são as experiências de vida, profissionais e etc que nos fazem refletir de alguma forma sobre as coisas. <span lang="EN-US">Nosso <i>background</i>. </span>Isso vai levar outro texto para analisar, mas vou comentar um pouco. Ouvi dizer, por exemplo, que a política de Aristóteles era ineficaz, porque ele conheceu poucos exemplos e não viveu tudo o que veio. E é uma anedota muito conhecida a que segue: uma edição do <i><a href="http://www.nytimes.com/">New York Times</a></i> traz mais informação do que um homem na Idade Média teria durante toda a vida. São historinhas. Mas demonstram qual é o potencial desse <i>background</i> imenso que temos, criado pela época frenética em que vivemos. Então, por que não chegamos aos pés dos antigos?</div>Duanne Ribeirohttp://www.blogger.com/profile/15758610155848080935noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-1101384088693234629.post-47962508338607537222010-03-19T22:11:00.000-07:002012-07-23T16:41:42.536-07:00O que mantém a Filosofia viva<div style="text-align: justify;">
1. Na primeira aula que tive no curso de graduação, entre outras considerações, citaram várias especificidades do ensino de Filosofia. A primeira é que o curso é estruturado de forma profissionalizante, assim como os demais cursos da universidade. A segunda é que, ao contrário desses outros cursos, não prepara o aluno para uma atividade específica, não o equipa para resolver determinado tipo de situação ou problema. À primeira vista, pensei que o professor iria explorar o que, para mim, se mostrava como uma evidente contradição. Quando um aluno de medicina cumpre a sua carga horária, supõe-se que ele objetivamente estará pronto para operar um apêndice ou corrigir um fígado; mas ao fim do currículo de Filosofia, qual objetivamente minha função? Se não há finalidade assentada, todo currículo vale como qualquer outro; da mediocridade à excelência, as opções são múltiplas e não há critério simples para distinguir entre o que seja bom e o que seja ruim, porque não há ideal.</div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
2. Isso é certamente válido para dois casos. A graduação, somada à licenciatura, dá um alvo claro ao recém-formado: ser professor. Qual o problema específico que um professor dessa matéria resolve? No Ensino Médio, tive três experiências. Ou o docente preenche a lousa com história e nos enche de frases que supõe-se conterem conceitos; ou ele tenta estimular uma série de discussões sem método sobre assuntos variados; ou uma união dos dois, que é o debate solto com interferência do professor citando a ideia de algum filósofo. O medíocre é possível em todos esses casos, e a sociedade nem teria como saber que ele o é, já que não há o modelo do que um filósofo deveria ser. Vou voltar a isso mais tarde. O outro caso que citei é o uso cotidiano do termo “filosofia”. Que significa qualquer ideologia, processo que deva ser seguido para qualquer coisa, opinião que se pense deslocada da realidade, de modo que todos sejam filósofos de alguma maneira ou de que a filosofia seja inútil de todo.</div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
3. A terceira consideração que foi feita é: muitos dos assuntos tratados na Filosofia estão de forma latente envolvidos com nossa própria personalidade, interesses individuais/pessoais, temas que às vezes nos afetam diretamente e, por isso, o pensar sobre esses assuntos corre o risco de ser violentado pelos nossos preconceitos, prevenções e prejuízos. Nos interessamos pelos filósofos com quem concordamos ou cujas ideias servem a sustentar nossos próprios pensamentos prévios. Borges me parece descrever bem isso em "A Biblioteca de Babel":</div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<blockquote style="text-align: justify;">
“Como todos os homens da Biblioteca, viajei na minha juventude; peregrinei em busca de um livro, talvez o catálogo dos catálogos; agora que meus olhos quase não podem decifrar o que escrevo, preparo-me para morrer, a poucas léguas do hexágono em que nasci. Morto, mãos piedosas não faltarão que me tirem pela varanda afora; minha sepultura será o ar insondável: meu corpo se fundirá dilatadamente e se corromperá e dissolverá no vento originado pela queda que é infinita. Afirmo que a Biblioteca é interminável.” [<a href="http://www.ciencias.com.br/pagina_bedaque/borges/A%20Biblioteca%20de%20Babel.htm">leia completo</a>]</blockquote>
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<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
4. No Ensino Médio, isso me descrevia de forma exata. Perguntei um dia à professora, que filosofia a seguir, de todas essas, <a href="http://www.youtube.com/watch?v=KoBwtAY3mms">os montes a derrapar nas prateleiras</a>, qual o filósofo acima do vulgo, qual as ideias que compilam o resto, indicam a senda de luz. Não perguntei assim não, mas era assim. Do alto do meu conhecimento de <i>O Mundo de Sofia</i>, eu queria saber:<i> so what</i>? E ela me respondeu a resposta desagradável: não há. Pegamos os fragmentos de cada um para construir nosso ser. Era a melhor resposta que ela podia dar ou essa era a melhor que ela podia dar <i>para mim</i>? É até injusto que eu descreva as aulas dela como descrevi. No começo, havia ímpeto, havia vontade, mas ela perdeu o ânimo, afogada no desinteresse que era o padrão da sala, talvez pelas ideias que se tem da Filosofia e que citei. De todo modo, ela me cuspiu que eu não seguia em direção a um messias.</div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
5. Se a Filosofia não se presta a embasar minha ideologia prévia; não se trata de um decorar esquemático da data em que nasceu Descartes e da única frase que disse: <i>penso, logo existo</i>; nem mesmo pode se achar com frequência na conversa delirante ou no bate-papo engajado cheio de palavras difíceis usadas sempre somente para provar o que o interlocutor quer, que inferno, então para que serve esse troço? Se é para ser professor, certo é que não seja para alimentar as atitudes enumeradas antes. Você pode estar pensando: <i>lá em cima ele disse que não há função, e agora pergunta, assim, leviano?</i> Acredito que haja uma função, sim. Mas ela não é um fator limitante. Não é uma estrada e o ponto de chegada. É o campo aberto e a incerteza. A floresta tenebrosa conosco no centro.</div>
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<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
6. Essa última imagem é um retrabalho do que li em Descartes, depois faço a citação e você decide se eu usei o francês de forma errada. Acredito — tanto pelo que vim lendo durante toda a minha formação, pelos livros da infância e adolescência, pelo curso de Jornalismo e também pelas características que eu quero reconhecer na graduação atual — que a “função” da Filosofia é preparar para atuar em meio àqueles problemas “resolvidos” pela técnica e avaliar o que está nas entrelinhas. É desmontar os discursos, reinterpretar resultados, seguir a atualidade ao mesmo tempo em que se acompanha o percurso das ideias desde sempre, e assim desconstruindo crenças na originalidade de ideologias ou apontando falhas velhas. É, enfim, <i>estabelecer a antesala da certeza</i>, o espaço a percorrer antes de se lançar à fé. E que talvez nunca seja vencido de todo. A Filosofia não pode ter um fim, porque ela é a origem.</div>
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<br /></div>
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7. Não creio que possa ser só isso, mas acredito fortemente que essa seja a sua alma. Nós, antes, citamos vários exemplos do que era <i>medíocre</i>; agora, todo esse outro conjunto de acepções creio que leva ao que se chama <i>excelência</i>, seja qual for a linha de pesquisa que se assuma no futuro. Admiti-lo é assumir o propósito original. Compreender o que mantém a Filosofia viva.</div>Duanne Ribeirohttp://www.blogger.com/profile/15758610155848080935noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-1101384088693234629.post-28848203874876121602010-03-14T20:08:00.000-07:002011-08-24T20:26:24.529-07:00Responsabilidade de Pensante<div style="text-align: justify;">Entre os 16 e 20 anos, mantive o <a href="http://www.eutenhoumblog.blogger.com.br/">eutenhoumblog</a>. Eis um texto da época.</div><div style="text-align: justify;">
<br /></div><div style="text-align: justify;">(adicionei links e de resto não fiz qualquer alteração. O texto é de <a href="http://www.eutenhoumblog.blogger.com.br/2003_12_01_archive.html">10/12/2003</a>.)</div><div style="text-align: justify;">---</div><div><div style="text-align: justify;">
<br /></div><b><div style="text-align: justify;"><span class="Apple-style-span" style="font-weight: normal;"><b>Responsabilidade de Pensante</b></span></div></b><div style="text-align: justify;">
<br /></div><div style="text-align: justify;">Mudar o mundo; Um animal é uma criança que só come, dorme e quer brincar. Um ser pensante é a criança que se considera o centro do mundo. Pensar, auto-denominar-se filósofo ou coisa que o valha é ter absoluta certeza de que suas idéias são melhores do que outras, é ter certeza de que sua concepção de vida é tão melhor que qualquer outra.</div><div style="text-align: justify;">
<br /></div><div style="text-align: justify;">É crer que as pessoas devem segui-lo. Que são um rebanho de condenados.</div><div style="text-align: justify;">
<br /></div><div style="text-align: justify;">Pensar é acreditar veementemente que o mundo todo está errado.</div><div style="text-align: justify;">
<br /></div><div style="text-align: justify;">Pois pense: se o mundo está certo, para que me preocupar? Nadar a favor da corrente seria a alternativa correta; e para meio bilhão de pessoas, a vida está certa, o mundo está certo - é assim que as coisas devem ser, então, vamos seguir a corrente, e chegar primeiro, se der.</div><div style="text-align: justify;">
<br /></div><div style="text-align: justify;">Controle populacional é fazer acreditar que as coisas estão certas, ou indo para algo certo; é criar um modus operandi da vida.</div><div style="text-align: justify;">
<br /></div><div style="text-align: justify;">E é claro que eu acho que isso está errado; 'Criatura pensante', não foi o que eu disse? '<a href="http://www.youtube.com/watch?v=iShDYFgivC4&feature=related">Bobeira é não viver a realidade</a>'. A realidade, não fui eu que criei, não posso reclamar. Mas acho que está errado não reclamar, então, reclamo.</div><div style="text-align: justify;">
<br /></div><div style="text-align: justify;">Pensar, filosofar, é fazer birra.</div><div style="text-align: justify;">
<br /></div><div style="text-align: justify;">A única responsabilidade do pensante é fazer birra, o máximo que puder. Depois que você morre, chamam isso de revolução, e, ou te amam, ou te adoram.</div><div style="text-align: justify;">
<br /></div><div style="text-align: justify;">Viver é ter alguém pra amar e alguém pra odiar.</div><div style="text-align: justify;">
<br /></div><div style="text-align: justify;">Não se pensa quando ama, não se pensa quando odeia.</div><div style="text-align: justify;">
<br /></div><div style="text-align: justify;">Pensar é não viver.</div><div style="text-align: justify;">
<br /></div><div style="text-align: justify;">Coisas pensantes abdicam da vida e entram em algo diferente.</div><div style="text-align: justify;">
<br /></div><div style="text-align: justify;">É responsabilidade de pensante voltar desse negócio estranho para a vida e dizer que foi legal.</div><div style="text-align: justify;">
<br /></div><div style="text-align: justify;">Afinal, todo mundo conta história, '<a href="http://www.youtube.com/watch?v=bzz7iiDge2g">no ato falho eu sou um fruto da criação</a>'.</div></div>Duanne Ribeirohttp://www.blogger.com/profile/15758610155848080935noreply@blogger.com1